TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
290 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL contrariedade à lei (a privação da liberdade viciada por erro na apreciação dos pressupostos de facto corres- ponde a uma situação em que a lei a não permitia); no segundo, já não. Assim, uma prisão preventiva legal e devidamente fundamentada quanto aos respetivos pressupostos ex ante (isto é, no momento em que é deter- minada) – uma previsão preventiva, por assim dizer, “regular” – não passa a ser ilegal ou injustificada, em virtude de o arguido que a sofreu vir posteriormente a ser absolvido (e igual consideração é também aplicável aos casos em que o arguido preso preventivamente não venha a ser acusado ou não venha a ser pronunciado). A relevância estrutural da letra do artigo 27.º, n.º 5, da Constituição (e o mesmo poderá ser dito a propósito do artigo 5.º, § 5, da CEDH) para limitar o conteúdo impositivo da injunção nele contida foi justamente sublinhada pela Conselheira Maria Fernanda Palma nas suas declarações anexas aos Acórdãos n. os 12/05 e 13/05: «[A] Constituição não pode limitar o legislador ordinário quanto ao que ele venha a entender por prisão preventiva manifestamente ilegal e injustificada, na medida em que tais qualificativos dependem dos pressupostos legais da prisão preventiva que são definidos, com alguma amplitude, pelo legislador ordinário. Nesse sentido, do artigo 27.º, n.º 5, da Constituição, bem como dos preceitos constitucionais que regulam a prisão preventiva, não resulta, esgotantemente, um conceito de prisão preventiva manifestamente ilegal ou injustificada, pelo que não se extrai de tais normas uma exigência absoluta quanto aos limites de tais conceitos, mas apenas, quando muito, um núcleo essencial da ilegalidade ou da “injustificabilidade” da prisão preventiva de acordo com os parâmetros constitucionais. Daqui resulta que não é óbvio, no plano do sentido das palavras, que uma prisão preventiva seja injustificada ou passe a ser manifestamente ilegal se, apesar de ser ex ante absolutamente legal e fundamentada, o arguido venha a ser absolvido. Não há uma exigência constitucional do conteúdo de tais conceitos que se imponha ao legislador ordinário. Aliás, o sentido das palavras não é regulável, em absoluto, pela Constituição, mas háde resultar da definição dos fundamentos da prisão preventiva pelo próprio legislador ordinário.» Em suma, confirma-se que a questão da atribuição de indemnização pela privação da liberdade apenas devido ao juízo absolutório ex post está fora do âmbito de proteção do disposto nos artigos 27.º, n.º 5, da Constituição e 5.º, § 5, da CEDH (cfr. supra o n.º 7, in fine ). Daqui não se segue, todavia, que a mesma questão não possa relevar à luz de outros parâmetros consti- tucionais (e convencionais). Do mesmo modo, aquela conclusão também confirma o caráter limitado da relação de especialidade do artigo 27.º, n.º 5, da Constituição face ao artigo 22.º do mesmo normativo. Na verdade, independen- temente do alcance da responsabilidade direta do Estado e demais entidades públicas constitucionalmente consagrada – apenas garantia institucional ou também direito fundamental à reparação; apenas responsabi- lidade por facto ilícito ou também por facto lícito –; e independentemente de saber se o primeiro daqueles preceitos constitucionais realiza um alargamento do princípio do segundo a factos ligados ao exercício da função jurisdicional, para além do erro judiciário, verifica-se que «na Constituição [se encontra] uma norma – o artigo 27.º, n.º 5 – sobre a responsabilidade civil do Estado especificamente pela “privação da liberdade contra o disposto na Constituição e na lei”, [sendo, por isso,] seguro que as hipóteses de responsabilidade pela privação da liberdade haverão de ser confrontadas, em primeira linha, com as exigências resultantes do preceito que especialmente o legislador constitucional lhe dedicou – esse artigo 27.º, n.º 5» (cfr. os Acórdãos n. os 12/05, n.º 14, e 13/05, n.º 12). 12. A redação dada pela Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, ao artigo 225.º do CPP veio tornar menos nítida a articulação dos requisitos de atribuição do direito de indemnização por privação da liberdade. Conforme referido no Acórdão n.º 185/10, na redação anterior à citada Lei, resultava uma articulação entre o disposto no n.º 1 e o disposto no n.º 2 daquele artigo «através de uma relação de subsidiariedade. A
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