TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

282 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 2. designadamente, o recorrente alegou que no âmbito de primeiro interrogatório judicial em inquérito, ocor- rido a 17.7.2015, [lhe foi] aplicada a medida de coação de prisão preventiva em que se manteve até 3.6.2016, data em que foi absolvido da prática dos 12 crimes de violação agravada e declarada extinta a medida de coação privativa da liberdade. 3. em resultado de tal absolvição o recorrente alega assistir-lhe o direito a ser indemnizado nos termos do dis- posto na alínea c) do n.º 1 do art.º 225° do Código do Processo Penal pedido que, a final, formula. 4. em contestação o recorrido, para além do mais, invoca que o pedido formulado carece de prévia revogação da decisão danosa como é imposto no n.º 2 do art.º 13.º da Lei 67/2007 (RRCEE). 5. tal interpretação foi acolhida pelo Tribunal de primeira instância e, em consequência, a ação foi julgada improcedente por falta de fundamento legal, referindo-se expressamente ao disposto no art.º 13.° n.° 2 da Lei 67/2007 de 31 de dezembro. 6. na sua decisão a Meritíssima Juiz a quo adianta, ainda, que a aplicação do disposto no art.º 225.º do Código do Processo Penal, invocado pelo recorrente, nunca seria aplicável pois “... o arguido/aqui A. não logrou provar a sua “inocência, …” cfr. fundamentação da decisão recorrida. 7. inconformado o recorrente recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça que concluiu pela procedência do recurso quanto à interpretação e aplicação do disposto no art.º 13.º, n.º 2 da Lei 67/2007. 8. e conclui, também, que o recorrente não comprovou o preenchimento do disposto na alínea c) do n.º 1 do art.º 225 do CPP, designadamente a demonstração de que não praticou os factos de que vinha acusado e, portanto, confirma a absolvição do Réu do pedido, sustentando a sua decisão nos Acórdãos 12/05, 13/05 e 185/10 deste Tribunal Constitucional. 9. por se tratar de questão controversa mereceu um voto de vencido [– a decisão do acórdão ora recorrido –] onde, também, vem referida a declaração de voto de vencido constante no Acórdão do Tribunal Constitucional n° 185/10 que se reproduzem por demonstrar com mais ciência as razões do presente recurso, designadamente: […] 10. dito de forma menos rigorosa, parece-nos que a interpretação restritiva da referida norma [– aquela que a decisão ora recorrida extrai do artigo 225.º, n.º 1, alínea c) , do CPP –] constitui uma manifesta regressão na afirmação de direitos fundamentais. 11. na verdade, todo o indivíduo é inocente desde que nasce até que, por sentença transitada em julgado, seja condenado. 12. impor a qualquer indivíduo a necessidade de demonstrar a sua inocência relativamente a qualquer indício ou mera insinuação, parece-nos, contrário à natureza e dignidade humana. 13. acima de tudo, a estrutura acusatória do processo penal determina que o acusado nada tem que demonstrar, assistindo-lhe mesmo o direito ao silêncio, cfr. art.º 61.º n.º 1 alínea d) Código do Processo Penal. 14. qualquer interpretação do estabelecido na alínea c) n.º 1 do art° 225.º CPP que restrinja o exercício do direito à referida comprovação positiva ou que o denegue por se sustentar em decisão absolutória ao abrigo do princípio in dubio pro reo , deve ser declarada inconstitucional por ofender o primado da Dignidade Humana, bem como, os princípios da presunção da inocência e da igualdade, cfr. art 1.°, 2.º, 13.º e 32.º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa, n.º 2 do art.° 6 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e n.º 5 do art.° 9.º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos. 15. como, aliás, tem vindo a ser declarado pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, vg. acórdãos Baars vs Países Baixos (2003), Capeau vs Bélgica (2005), Grabchuk vs Ucrânia (2006), Tendam vs Espanha (2010) e, em especial, o acórdão Sekanina vs Austria (1993). 16. pelo que deve ser concedido provimento ao presente recurso e declarada a inconstitucionalidade da alínea c) do n.º 1 do art.º 225.º do Código do Processo Penal quando interpretada no sentido de que o exercício deste direito está sujeito à comprovação positiva da inocência ou que denegue tal direito por se sustentar em decisão absolutória ao abrigo do princípio in dubio pro reo .» 4. O Ministério Público, ora recorrido, defende nas suas alegações, desde logo, que o recurso não deverá ser conhecido, porquanto o recorrente, ao contrário do que refere, não suscitou previamente, perante o

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