TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

268 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Prossegue o mesmo autor, quanto à hipótese prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 68.º do CPP ( ob. cit. , pp. 791/793): “[…] A figura central na definição de legitimidade para constituição como assistente continua, apesar da morte, a ser o “ofendido”. E assim é preciso que o defunto fosse, ele mesmo, titular do interesse que a lei especialmente quis proteger com a incriminação [al. a) ]. Sendo esse o caso, já não podendo em razão do decesso constituir-se como assistente, transmite-se a faculdade às pessoas que com ele estavam em relação privilegiada de proximidade existencial. […] A legitimidade para constituição como assistente nos termos da alínea c) [do n.º 1 do artigo 68.º do CPP] mantém-se mesmo que o falecido tivesse já essa qualidade. Não por este já se ter constituído como assistente, mas por ser ainda o ofendido. […]”. A este propósito, note-se que a decisão recorrida – e este é um ponto particularmente relevante para a adequada compreensão do objeto do recurso – admitiu que o recorrente, por ser sobrinho da primitiva assis- tente, cabe na previsão da alínea c) do n.º 1 do artigo 68.º do CPP, ou seja, considerou que ele se integra na categoria das pessoas com a faculdade de se constituírem assistentes após o falecimento do titular do interesse protegido com a incriminação. A sua pretensão foi indeferida por um motivo de natureza processual: uma preclusão decorrente de ter sido ultrapassado um determinado marco do processo penal (o 5.º dia anterior ao início do debate instru- tório). Deste modo, não importa, propriamente, indagar se a Constituição garante às pessoas na posição do recorrente, em geral, a faculdade de se constituírem assistentes (pois essa faculdade não foi genericamente negada), mas antes se a assinalada preclusão é compatível com a Lei Fundamental. É nesse conspecto que se analisará a tutela que a Constituição confere ao assistente. 2.3. Nos termos do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição (CRP), “[o] processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso”. É pacífico, na jurisprudência constitucional, que aquela norma visa unicamente o arguido, não podendo o assistente invocá-la em seu favor (cfr., entre outros, os Acórdãos n. os 118/17, 326/12, 464/03, 259/02 e 194/00; no mesmo sentido, Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Ano- tada, vol. I, 4.ª edição, Coimbra, 2014, pp. 516 e 523). A posição do ofendido/assistente enquadra-se diretamente na previsão do n.º 7 do artigo 32.º da CRP, nos termos do qual “[o] ofendido tem o direito de intervir no processo, nos termos da lei”. Trata-se de uma formulação consideravelmente aberta, como assinalam Gomes Canotilho e Vital Moreira, ob. cit. , pp. 523 e 524: “[…] Diferentemente do que acontece em relação ao arguido, a lei constitucional não especifica as dimensões funda- mentais do direito do ofendido intervir no processo, remetendo para a lei («nos termos da lei») essa tarefa. Esse reenvio para a lei não pode, porém, interpretar-se no sentido de uma completa liberdade de conformação por parte do legislador dos poderes processuais do ofendido. Dentre estes, o legislador não pode deixar de consagrar o direito (poder) de acusar, o poder de requerer a instrução (no caso de arquivamento dos autos por deliberação do Ministério Público), o poder de recorrer da sentença absolutória (…)». […]” (itálico acrescentado).

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