TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

267 acórdão n.º 281/20 Entendeu o Tribunal da Relação do Porto que, uma vez que “[…] os autos não prosseguem para a fase de julgamento, […] o requerimento para constituição de assistente é extemporâneo”. Com efeito – e citamos de novo a decisão recorrida –, “[q]uando a decisão instrutória tenha sido a pronúncia, ainda que parcial, implicando o prosseguimento dos autos para a fase de julgamento, o interessado pode requerer a sua cons- tituição como assistente até cinco dias antes do início da audiência de julgamento, não podendo, porém, questionar o decidido na fase da instrução, designadamente recorrer da decisão instrutória na parte em que não tiver pronunciado o arguido […]”. É na sequência desta sucessão de atos do processo que resulta questionada, perante o Tribunal Consti- tucional, a norma sub judice , que – face ao enunciado que consta do despacho do relator referido em 1.2.6., supra – carece, ainda, a bem da total fidelidade ao sentido decisório expresso na decisão recorrida, da exata menção de que o problema se coloca na fase de instrução (visto que a norma da alínea a) do n.º 3 do artigo 68.º do CPP regula dois prazos distintos, da fase de instrução e da fase de julgamento). Trata-se de uma concretização meramente formal, a bem de uma delimitação do objeto do recurso mais precisa, que nada acrescenta à respetiva substância, já que se limita a tornar explícito um elemento implícito, que o recorrente não contesta, sendo, aliás, pressuposto da sua argumentação. Constitui, assim, objeto do recurso a norma contida na alínea a) do n.º 3 do artigo 68.º do CPP, na interpretação segundo a qual se exclui a possibilidade de constituição como assistente, na fase de instrução, decorrido o prazo nela consignado, daquele que só adquire legitimidade para se constituir como tal em consequência da morte de quem tempestivamente havia requerido a sua constituição como assistente e foi admitido a intervir nessa qualidade (esta delimitação contém um ajustamento meramente formal do enun- ciado que consta do despacho do relator referido em 1.2.6., supra ). 2.2. A posição de assistente desenhou-se há muito no sistema processual penal português. Como escla- rece Pedro Soares de Albergaria, Comentário Judiciário do Código de Processo Penal, Tomo I, Coimbra, 2019, pp. 780/781): “[…] A figura do assistente foi introduzida pelo DL 35.007, de 13.10.1945 (arts. 4.º e 5.º), diploma que veio mate- rializar a primeira grande Reforma do processo penal português na vigência do CPP/29, sucedendo […] às ‘partes acusadoras’ previstas no último (arts. 11.º a 21.º). Como explicou Jorge de Figueiredo Dias ([Direito Processual Penal, 1974], p. 511), o intuito daquele primeiro diploma foi o de sublinhar a natureza pública da ação penal (logo afirmada no respetivo art. 1.º), terminando com as partes acusadoras e transformando os particulares de sujeitos principais que podiam ser no domínio do CPP/29 em ‘simples assistentes’ do MP […]. Sendo figura que distingue o processo penal português dos seus congéneres pelo modo generoso como possibilita à vítima ter uma voz conformadora do processo e objeto dele, tem sofrido nos últimos anos, porventura por mor de entendimento deficiente do alcance das obrigações decorrentes para o Estado português de instrumentos internacionais, uma certa descaracterização, quer pela introdução de um conceito normativo de vítima (art. 67.º-A) em aparente (e confuso) concurso com o assistente enquanto sujeito processual, quer pela pouca criteriosa proliferação das pessoas ou entidades (mesmo públicas) a quem leis especiais conferem legitimidade para assumir tal estatuto (art. 68.º/1), quer pela multiplicidade de critérios que sustentam, nessas leis, essa possibilidade, quer enfim pelo alargamento pro vezes dificilmente racionalizável dos respetivos poderes […]. Seja como for, sendo esta a primeira norma do Título V do Livro I do CPP [refere-se o autor ao artigo 68.º] relativa ao ‘assistente’ debalde nela, ou noutra qualquer, se procurará uma definição, muito embora da relação do n.º 1 deste preceito com o art. 69.º se possa concluir que aquele é o ‘sujeito processual que intervém no processo como colaborador do Ministério Público na promoção da aplicação da lei ao caso e legitimado em virtude da sua qualidade de ofendido ou de especiais relações com o ofen- dido pelo crime ou da natureza deste’ (Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal , vol. I, 1994, p. 301). […]”.

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