TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

240 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL segundo a qual o nível de proteção assegurado pelo princípio da legalidade à determinabilidade dos ilícitos contraordenacionais e respetivas sanções não é o mesmo exigido para os crimes, sendo portanto menor a exigência de determinação relativamente ao conteúdo do ilícito típico nas contraordenações. E também não se desconhece a jurisprudência segundo a qual o art. 29.º da Constituição não se aplica imediatamente ao ilícito de mera ordenação social.» Também o recorrente B. invocou a inconstitucionalidade da «alínea m) do artigo 210.º do RGICSF, interpretada e aplicada pelo Acórdão recorrido no sentido de que é possível aplicar uma coima por remis- são para expressões vagas e imprecisas consagradas nas normas do Aviso n.º 5/2008 (BdP)»; e à «alínea m) do artigo 210.º do RGICSF, interpretada e aplicada pelo Acórdão recorrido no sentido de que é possível aplicar uma coima, através da remissão da definição dos comportamentos concretos suscetíveis de integrar a contraordenação, para as normas dos artigos 11.º, n. os 1 a 3, 13.º, n. os 1 e 2, 15.º, n.º 2, alíneas b) e d) , 18.º, n.º 2, do Aviso n.º 5/2008». Entendeu o recorrente que as normas indicadas são inconstitucionais «por violação do n.º 1 do artigo 29.º da CRP (princípio da legalidade)». Na Decisão Sumária agora reclamada entendeu-se que esta constituía também uma questão simples, atenta a vasta jurisprudência já prolatada pelo Tribunal Constitucional sobre o princípio da legalidade, mais especificamente sobre a sua dimensão de tipicidade e a problemática das ditas normas sancionatórias em branco, tanto no domínio penal como no domínio contraordenacional. Lançou-se aí mão da jurisprudência consignada no Acórdão n.º 41/04, já acima referido, e que, embora não tenha versado sobre estas precisas questões de constitucionalidade, se debruçou-se sobre questões a elas adjacentes e sobre o específico domínio contraordenacional aqui em causa. Recorde-se que nesse aresto se considerou o seguinte: «(...) 5.  O problema de cuja solução depende a decisão da anterior questão tem várias dimensões. A primeira dimensão diz respeito ao nível de proteção assegurado pelo princípio da legalidade à determina- bilidade dos ilícitos contraordenacionais e respetivas sanções. Poder-se-á falar de uma exigência de determinação relativamente ao conteúdo do ilícito típico nas contraordenações tal como é exigida para os crimes? Em que medida é que tais ilícitos poderão ser definidos por critérios cuja concretização dependerá, necessariamente, de normas técnicas que modelarão o seu conteúdo exato? As chamadas normas em branco que remetem o conteúdo da sua precisão para normas de fonte hierarquicamente inferior estão vedadas no direito de mera ordenação social nos mesmos termos do direito penal? A estas questões gerais acresce uma outra que as normas em crise particularmente suscitam – a de saber se a definição pela norma tipificadora do ilícito é suficientemente indicativa dos critérios que, por via regulamentar, concretizarão a previsão normativa, de modo a que estejam salvaguardados os princípios constitucionais que vigo- ram no direito sancionatório público. No que diz respeito à primeira dimensão, é certo que a Constituição não requer para o ilícito de mera ordena- ção social o mesmo grau de exigência que requer para os crimes. Nem o artigo 29.º da Constituição se aplica ime- diatamente ao ilícito de mera ordenação social nem o artigo 165.º confere a este ilícito o mesmo grau de controlo parlamentar que atribui aos crimes. Está, porém, consolidado no pensamento constitucional que o direito sancionatório público, enquanto res- trição relevante de direitos fundamentais, participa do essencial das garantias consagradas explicitamente para o direito penal, isto é, do núcleo de garantias relativas à segurança, certeza, confiança e previsibilidade dos cidadãos (cf. Acórdãos do Tribunal Constitucional n. os 158/92, de 23 de abril, 263/94, de 23 de março, publicados no D.R. , II Série, de 2 de setembro de 1992 e de 19 de julho de 1994, e n.º 269/03, de 27 de maio, inédito). E se tal não resulta diretamente dos preceitos da chamada Constituição Penal, resultará, certamente, do princípio do Estado de Direito consagrado no artigo 2.º da Constituição. Por outro lado, também é verdade que a Constituição ao não consagrar reserva de lei parlamentar quanto à tipificação dos concretos ilícitos de mera ordenação social, admite uma inerente flexibilidade quanto às fontes nor- mativas de tais ilícitos, as quais poderão ter, em última análise, a natureza de fontes regulamentares.

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