TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

229 acórdão n.º 270/20 como a indicada, não se aplica um impedimento ao exercício da competência que aquela norma, prima facie , confere. A constitucionalidade da competência fixada no referido preceito, em si mesma, não foi colocada em crise, pelo que a norma segundo a qual, na situação indicada, o exercício de tal competência deveria ficar inibido, só poderia retirar-se de outros preceitos legais, desde logo os preceitos do RGCO e do Código de Procedimento Administrativo onde é regulada a matéria dos impedimentos. Sucede que, ao reconduzir a norma a preceitos inadequados, o recorrente acabou por fazer a sua questão versar sobre a decisão recorrida em si mesma considerada, no sentido de aí se ter considerado que, em concreto, não estava vedado a qual- quer membro do órgão em causa o exercício daquela competência. Isso impede o Tribunal Constitucional de conhecer essa questão, ou de outro modo estaria a sindicar a decisão recorrida enquanto tal, e não já a apreciar a possível desconformidade entre uma norma de direito ordinário com a Constituição. O recorrente não reclamou deste entendimento. Trata-se, aliás, da única das suas dezanove questões cuja apreciação pelo Tribunal Constitucional o recorrente não contesta. 11. Na Decisão Sumária reclamada considerou-se que semelhante problema – sc. , a ausência de caráter normativo – fere a questão indicada na alínea b) do recurso, onde o recorrente invocou a inconstitucionali- dade dos «artigos 215.º, n.º 3, anterior 219.º, n.º 3 (atual 219.º-A, n.º 1), e 220.º, n.º 1. todos do RGICSF, e 54.º, n.º 2. do RGCO, interpretados e aplicados pelo acórdão recorrido no sentido de que o Banco de Portugal pode, enquanto entidade sancionatória a nível contraordenacional, utilizar no processo de contraor- denação elementos probatórios fornecidos pelo arguido, maxime declarações e informações, antes do pro- cesso, sem que lhe tenham sido feitas quaisquer advertências sobre a possibilidade de autorresponsabilização contraordenacional e os respetivos direitos de defesa». O recorrente reclama que este enunciado normativo decorre dos preceitos por si indicados e que isso é comprovado inter alia pelo facto de a decisão recorrida se ter pronunciado no sentido da conformidade de tal enunciado com a Constituição. No entanto, não sofre abalo a posição que se sustentou na Decisão Sumária reclamada. Em primeiro lugar, importa notar que o facto de a decisão recorrida ter entendido que não ocorrera qualquer violação da Constituição não significa que a suposta inconstitucionalidade alegada pelo recorrente decorresse das disposições por si indicadas. E, no caso, não decorre: conforme se sustentou e não pode senão agora reiterar-se, do conjunto de preceitos indicados pelo recorrente não pode extrair-se uma norma segundo a qual é possível «utilizar no processo de contraordenação elementos probatórios for- necidos pelo arguido, maxime declarações e informações, antes do processo, sem que lhe tenham sido feitas quaisquer advertências sobre a possibilidade de autorresponsabilização contraordenacional e os respetivos direitos de defesa». O que desde logo se prescreve no artigo 215.º, n.º 3, do RGICSF, é que: «Quaisquer pessoas e entidades têm o dever de prestar ao Banco de Portugal todos os esclarecimentos e informações, bem como de entregar todos os documentos, independentemente da natureza do seu suporte, objetos e ele- mentos, na medida em que os mesmos se revelem necessários à instrução dos processos da sua competência.» Da prescrição desse dever – e, mais especificamente, do facto de a mesma não surgir acompanhada de um dever de advertência contra a eventualidade de autorresponsabilização contraordenacional – não pode porém concluir-se que sejam suscetíveis de utilização no processo contraordenacional as provas obtidas através do cumprimento de um tal dever por parte dos seus destinatários, conclusão essa que igualmente se não pode extrair de qualquer dos outros preceitos em torno dos quais o recorrente procurou estruturar esta questão, nenhum dos quais respeita à matéria da validade da prova. O facto de o conjunto de preceitos invocado não albergar o enunciado contra o qual o recorrente pretendia reagir impede uma pronúncia de fundo em relação a esse enunciado. Não se trata de excessivo formalismo, mas de uma consequência natural e inevitável do positivo sistema de fiscalização concreta da constitucionalidade, que apenas admite a sindicância de enunciados subsumíveis no conceito funcional de norma – ou seja, e nas palavras usadas por exemplo no Acórdão n.º 175/06, «normas jurídicas que estejam recortadas em disposições ou preceitos que resultem do exercício de um poder normativo» – sob pena de ficar desvirtuado o próprio papel que foi conferido ao Tribunal Constitucional, que então poderia ser chamado a

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