TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

226 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL posteriormente requerer a fiscalização da constitucionalidade de tal interpretação normativa, nos termos do disposto nos artigos 70.º, n.º 1, alínea b) , e 72.º, n.º 1, alínea b) , e n.º 2, da LTC. Ora, este entendimento não é infirmado pela reclamação em apreço, não vindo apresentada, por exemplo, qualquer decisão de um tribunal judicial em que a interpretação em causa não tivesse acolhida, assim evidenciando a sua objetiva imprevisibilidade para o recorrente. Apresentadas vêm, aliás, no parecer do Banco de Portugal, decisões em que se acolheu o preciso entendimento que o recorrente reputa de surpreendente (vide a p. 5 e seguinte). Por outro lado, como nota o Ministério Público no seu parecer, é irrelevante a invocação do Acórdão do Tribu- nal Constitucional n.º 522/08, porquanto a existência de um acórdão que conheça do mérito de uma dada questão de constitucionalidade – e isto sem discutir a real relevância da questão conhecida nesse acórdão para aquela agora e aqui em causa – nada nos diz sobre se num outro caso se encontram ou não preenchidos os pressupostos processuais cuja verificação é indispensável para que aquele conhecimento tenha lugar. O mesmo problema prejudicou a segunda questão colocada pelo recorrente no seu recurso, relativa ao «complexo normativo constituído pelos artigos 358.º ou 359.º do CPP ex vi art. 41.º do RGCO, art. 58.º n.º 1 do RGCO e art. 374.º n.º 2 do CPP ex vi art. 41.º do RGCO, por violação dos Princípios da confiança e da segurança jurídica, decorrentes da ideia de Estado de direito consagrada no art. 2.º da CRP, e por vio- lação também dos direitos de Defesa do arguido em processo contraordenacional, consagrados no art. 32.º n.º 10 da CRP, na vertente em que as garantias de defesa abrangem o direito do arguido a um julgamento, nos termos do art. 59.º e segs do RGCO, no qual sejam apreciados todos os factos considerados relevantes para a determinação da sua responsabilidade contraordenacional, sendo os preceitos constitucionais acima referidos conjugados ainda com o art. 18.º n.º 2 da mesma CRP». Uma vez mais, foi o próprio recorrente que assumiu não ter suscitado previamente essa questão perante o tribunal recorrido. Porém, analisados aqueles preceitos, a reclamação agora deduzida e até o próprio recurso interposto pelo recorrente para o tribunal recorrido (na parte conhecida a pp. 651 e seguintes da sua decisão) – onde a questão foi aflorada sem que, no entanto, tenha sido suscitada qualquer questão de constitucionalidade –, não foi uma vez mais possível considerar que aquele entendimento do tribunal recorrido se tenha apresentado como imprevisível para o recorrente em termos de este poder e dever considerar-se dispensado de ter suscitado previamente a sua inconstitucionalidade. Explicitamente assumido pelo recorrente foi também o facto de a quarta questão colocada no seu recurso não ter sido previamente suscitada. Trata-se aqui da questão relativa aos «artigos 210.º al. m) do RGICSF e 18.º e 20.º do Aviso n.º 5/2008 do Banco de Portugal, conjugados com o art. 8.º do RGCO e art. 14.º do CP, aplicável ex vi art. 32.º do RGCO, (...) na interpretação normativa feita pelo Acórdão recorrido segundo a qual o dolo é presumido a partir da prova dos factos que revelam a culpa em sentido lato (voluntariedade, liberdade e consciência da ilicitude), sem qualquer outro suporte factual, ou seja, sem que haja uma descrição dos concretos factos psicológicos em que se consubstancia o dolo (representação mental dos factos típicos e vontade do agente de ocorrência desses factos), dos quais o arguido não se pôde evidentemente defender». Uma vez mais, não pôde considerar-se – e não resulta agora infirmado pela reclamação, mediante a apresen- tação de argumentos novos – que tal questão se tenha perfilado como nova para o recorrente. Assim, não pode senão reiterar-se o que consta já da Decisão Sumária reclamada: que já em 1.ª instância se considerara que a factualidade dada como provada era suficiente para afirmar o dolo, sendo que essa factualidade se manteve inalterada na decisão do Tribunal da Relação. O ponto incontornável quanto a todas estas questões é o de que a previsibilidade relevante para efeitos do pressuposto processual aplicado na referida Decisão Sumária – i. e. , o pressuposto da suscitação prévia e adequada – só pode, em face do regime legalmente estabelecido e sob pena de disparidade no reconhecimento de legitimidade no acesso à justiça constitucional, ser aferido num sentido objetivo, e não num sentido subje- tivo. O que releva de modo decisivo é que tal previsibilidade seja abstratamente suscetível de assistir a qualquer hipotético recorrente segundo padrões de diligência médios. Este constitui um entendimento estável do Tri- bunal Constitucional, como exemplificam os recentes Acórdãos n. os  633/17, 712/17, 32/18, 344/18 e 487/18 ou 490/18. Como se afirmou já, não se trata de determinar se um concreto recorrente, num dado recurso,

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