TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
213 acórdão n.º 268/20 revisão constitucional de 1997, com o aditamento feito na parte final do n.º 1 do artigo 32.º (“O processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso”), convoca diretamente a aplicabilidade do princípio da proporcionalidade, não apenas para proscrever soluções legais negatórias da admissibilidade do recurso, mas também como critério aferidor da legitimidade dos condicionamentos e da tramitação legal dos recursos. E o juízo de proporcionalidade a emitir neste domínio não pode deixar de tomar em consideração três veto- res essenciais: (i) a justificação da exigência processual em causa; (ii) a maior ou menor onerosidade na sua satisfação por parte do interessado; e (iii) a gravidade das consequências ligadas ao incumprimento do ónus. Na jurisprudência precedentemente citada firmou-se o entendimento de que, nas situações apreciadas, se justificava a formulação de convite, antes de se considerar irremediavelmente precludido o conhecimento dos recur- sos interpostos, por tal ser a solução que melhor se coaduna com a ponderação entre o interesse na celeridade própria do processo penal e o asseguramento das garantias de defesa e do direito de recurso. A concordância prática entre o valor da celeridade, conatural ao processo penal, e a plenitude das garantias de defesa é possível, com a formulação de convite para, em prazo curto, ser suprida a deficiência, “sem necessidade de se chegar ao extremo de fulminar desde logo o recurso, em desproporcionada homenagem ao valor celeridade, promovido, assim, à custa das garantias de defesa do arguido”.» (itálico aditado) Por conseguinte, importa sujeitar a dimensão normativa objeto do presente processo a um juízo de proporcio- nalidade, aderindo-se, para esse efeito, à ponderação destes três vetores essenciais, aventados na jurisprudência do Tribunal Constitucional. 13. No que respeita à situação dos autos, não exige desenvolvida demonstração a conclusão de que a exigência de apresentação pelas partes das peças processuais por um dos três meios previstos no artigo 144.º, n. os 7 e 8, do CPC (entrega na secretaria judicial, remessa por correio, sob registo ou através de telecópia) é justificada. Trata- -se de uma exigência funcionalmente adequada aos fins, não podendo afirmar-se que se trata de uma imposição arbitrária sem qualquer sentido útil para a tramitação processual. Não se trata, por outro lado, manifestamente, de um ónus particularmente gravoso ou difícil de satisfazer por parte do Recorrente. No entanto, a interpretação normativa que nos ocupa neste processo abrange não o ónus, em si, mas o desvalor jurídico com que se comina o seu incumprimento: neste caso, a nulidade do recurso. Para analisar o problema de constitucionalidade do critério normativo sob fiscalização deve começar-se por referir que a consequência jurídica da inobservância de um meio de comunicação do ato – requisito formal – não se encontra expressamente prevista na letra do texto legal. Como resulta do que acima se explanou de forma detalhada, ao tempo da prática do ato afigurava-se contro- verso determinar, com a devida segurança, qual o regime jurídico aplicável à apresentação do requerimento de recurso, em sede de processo penal. Por um lado, no Código de Processo Penal subsistia a inexistência de norma reguladora. Por outro lado, a profusão e sucessão, de disciplinas legais gerou tal dúvida interpretativa que levou o Supremo Tribunal de Justiça, perante a existência de arestos de teor contraditório, a prolatar um acórdão unifor- mizador de jurisprudência. No entanto, este aresto acabou por não pôr termo, em definitivo, à controvérsia, face à aprovação posterior de um novo Código de Processo Civil. Neste contexto, é necessário aferir se a sanção constante da dimensão normativa sob análise resiste ao teste do princípio da proporcionalidade. (…) Ora, no caso dos presentes autos, estamos perante um quadro em que existiam dúvidas razoáveis sobre qual a via imposta pelo texto legal para a apresentação do requerimento de recurso mesmo que os interessados atuassem de acordo com os deveres de uma conduta processual diligente e observassem os ditames de prudência técnica. É neste enquadramento que devemos analisar a norma que qualifica como nula a apresentação (dentro do prazo) do requerimento de recurso através de correio eletrónico – num cenário de incerteza interpretativa –, o que tem como consequência inexorável a sua rejeição por extemporaneidade, pois apenas viria a ser considerada a data da apresentação dos duplicados (já fora do prazo). Note-se igualmente que a sanção do não recebimento do recurso é determinada, de uma forma inovatória e surpreendente, sem que seja dada aos recorrentes uma específica
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