TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
209 acórdão n.º 268/20 6. O Ministério Público apresentou contra-alegações, pronunciando-se sobre a delimitação do objeto do recurso e concluindo, nos seguintes termos (cfr. fls. 105-109 e 135-136): «III. Da interposição do recurso de constitucionalidade e da restrição do seu objeto (…) Com efeito, compulsando o despacho recorrido (cfr. supra n.º 6 das presentes contra-alegações), a argumen- tação aduzida pela Ilustre Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Coimbra baseou-se, expressamente, no art. 144.º, n.º 1 do Código de Processo Civil e no art. 1.º da Portaria 280/2013, na redação introduzida pela Portaria 170/2017. Por outro lado, na motivação da reclamação apresentada perante o Tribunal da Relação de Coimbra, o próprio arguido (cfr. supra n. os 4 e 5 das presentes contra-alegações) reporta-se fundamentalmente aos arts. 132.º e 144.º do Código de Processo Civil (por remissão do art. 4.º do Código de Processo Penal) e para o disposto nas Portarias 280/2013 [designadamente os arts. 1.º, n.º 2 e n.º 6, al. b) e art. 5.º, n.º 1 desta Portaria] e 170/2017 (preâmbulo desta última Portaria). Assim, as disposições referidas nos pontos 3 a 5 da motivação da reclamação do arguido não foram, por ele, devida e atempadamente suscitadas perante o tribunal recorrido, o Tribunal da Relação de Coimbra, em termos de este as ter podido apreciar. As presentes contra-alegações centrar-se-ão, assim, nos pontos 1 e 2 do objeto do recurso do arguido, ou seja, respeitantes ao art. 144.º, n.º 1 do Código de Processo Civil e ao art. 5.º, n.º 1 da Portaria 280/2013. IV. Apreciação do thema decidendum e conclusões (…) 32.º Ora, no caso dos presentes autos, o arguido, ora recorrente, apresentou tempestivamente as suas alegações de recurso, primeiro por correio eletrónico, depois em suporte de papel, sendo, por isso, tais alegações suscetíveis de ser conhecidas e apreciadas, quer pelo tribunal de 1.ª instância, quer pelo tribunal de recurso. E a imediata rejeição do recurso, pelo simples motivo de não ter sido apresentado por transmissão eletrónica de dados (uma simples deficiência), sem se dar a possibilidade ao recorrente de suprir o seu lapso e de corrigir a forma de apresentação da sua peça processual, traduz-se numa decisão que acaba por lhe não permitir o acesso a uma decisão adequada à sua pretensão, ou seja, que lhe nega o acesso ao tribunal e a uma tutela jurisdicional efetiva, restringindo o seu direito de defesa e o seu direito ao recurso e a um duplo grau de jurisdição, previstos no art. 32.º da Constituição. Com tal atuação, não se crê que ambas as instâncias hajam propugnado por «um processo informado pelos princípios materiais da justiça nos vários momentos processuais, de modo a que seja adequado a uma tutela judicial efetiva», ou hajam concretizado um «direito a um processo orientado para a justiça material sem demasiadas peias formalísticas». Por outras palavras, «os ónus impostos não poderão, por força dos artigos 13.º e 18.º, n. os 2 e 3, da Constitui- ção, impossibilitar ou dificultar, de forma arbitrária ou excessiva, a atuação procedimental das partes, nem as comi- nações ou preclusões previstas, por irremediáveis ou insupríveis, poderão revelar-se totalmente desproporcionadas face à gravidade e relevância, para os fins do processo, da falta cometida, colocando assim em causa o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva». O que, pelo contrário, se esperaria, de ambas as instâncias, era a concretização da ideia de que «o direito ao processo, conjugado com o direito à tutela jurisdicional efetiva, impõe que se atribua prevalência à justiça material sobre a justiça formal, evitando-se soluções que, devido à exigência de cumprimento de «requisitos processuais», conduzam a uma decisão que, bem vistas as coisas, se poderá traduzir numa verdadeira denegação de justiça».
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