TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
199 acórdão n.º 263/20 unidade da ordem jurídica, não de um direito subjetivo ou situação ativa equiparada dos cidadãos (de cada cidadão litigante) a deduzir uma pretensão dirigida à manutenção ( ou pelo menos à uniformização ) da jurisprudência». Ora, atentas as considerações já expendidas, observa-se que a interpretação normativa em que se sustentou o juízo decisório do tribunal a quo, assente na imposição da verificação dos pressupostos do recurso de revista con- sagrados no artigo 671.º, n.º 1, do CPC, como delimitativa da admissibilidade do recurso de revista plasmado na alínea d) do n.º 2 do artigo 629.º do mesmo diploma legal, não se afigura arbitrária ou aleatória, antes encontrando uma justificação objetiva na teleologia deste tipo de recurso – que visa, como referimos, a proteção do interesse geral na boa aplicação do direito e a segurança jurídica no âmbito de causas que legalmente se encontram impedi- das, por motivo estranho à alçada, de ser submetidas à apreciação do Supremo Tribunal de Justiça – conjugada com uma política de racionalização do acesso ao órgão de cúpula da ordem jurisdicional. Resta, assim, concluir que o critério normativo erigido como objeto do recurso não viola o artigo 20.º, n. os 1 e 4, da Constituição da República Portuguesa». Atentas as considerações supra transcritas, conclui-se, sem necessidade de maiores desenvolvimentos, que a interpretação normativa que fundou o juízo decisório do tribunal a quo, ao estabelecer um pressuposto que limita o acesso à jurisdição do órgão de cúpula da hierarquia dos tribunais comuns, cumprindo o obje- tivo de reservar a sua intervenção, no âmbito da uniformização de jurisprudência de acórdãos das Relações, para aqueles casos em que, atenta a matéria ou o procedimento em causa, nunca o mesmo seria chamado a pronunciar-se por existir norma específica que impediria o acesso a esse órgão, não viola a garantia de acesso ao direito, a tutela jurisdicional efetiva e o direito a um processo equitativo, consagrados nos n. os 1 e 2 do artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, sendo certo que deste normativo não resulta um direito irrestrito de acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, nem tão pouco, um direito ao recurso para uniformização de jurisprudência. · O princípio da segurança jurídica 9. A recorrente defende que o critério normativo que imputa inconstitucional o é, igualmente, por vio- lação do princípio da segurança jurídica, consagrado no artigo 2.º da Constituição da República Portuguesa. A este respeito, a recorrente começa por referir que, de acordo com Jorge Miranda e Rui Medeiros ( Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2.ª edição, p. 103), o princípio da segurança jurídica, no que concerne à função legislativa, «obriga a que a lei satisfaça, entre outras, exigências de razoabilidade, como não arbitrariedade, adequação às necessidades coletivas e coerência interna das normas». Sublinhando que a «norma do artigo 629.º, n.º 2, alínea d) , do CPC é determinada por uma finali- dade de criação de uma válvula de escape do sistema para situações de bloqueio em que se torna necessário permitir o acesso ao STJ para superar divergências entre decisões das Relações», invoca a recorrente que a dimensão normativa sindicada nestes autos «leva a que em muitas situações em que estão em causa decisões aptas a resolver definitivamente questões atinentes à relação processual fique vedado o recurso para o STJ com fundamento em oposição de acórdãos e se perpetue, assim, sem possibilidade de ser desfeita, a divergên- cia entre decisões dos tribunais superiores, com prejuízo para o prestígio da justiça e para a previsibilidade das decisões judiciais e sem que se descortine razoabilidade nem coerência na linha que a lei traçou entre as decisões suscetíveis de recurso por oposição de acórdãos e aquelas que o não são». A recorrente problematiza aqui a conformidade com a Constituição do critério normativo que configura objeto do presente recurso na ótica da violação do princípio da segurança jurídica, enquanto valor matricial do Estado de direito democrático, na sua específica dimensão de sujeição do poder legislativo ao dever de satisfazer exigências de razoabilidade no âmbito das previsões normativas, designadamente em matéria de recursos civis. Ora, perante o que se vem de afirmar, a interpretação normativa adotada pelo tribunal a quo para fundar o seu juízo decisório, ao definir as exigências a que está sujeita a admissibilidade do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça com fundamento em contradição de julgados das Relações, mais não é do que o resultado
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