TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
183 acórdão n.º 262/20 responsabilidades, pode ser submetido a certas formalidades, condições, restrições ou sanções, previstas pela lei, que constituam providências necessárias, numa sociedade democrática, para a segurança nacional, a integridade territorial ou a segurança pública, a defesa da ordem e a prevenção do crime, a proteção da saúde ou da moral, a proteção da honra ou dos direitos de outrem, para impedir a divulgação de informações confidenciais, ou para garantir a autoridade e a imparcialidade do poder judicial” e o artigo 19.º, n.º 3, do Pacto Internacional dos Direi- tos Civis e Políticos dispõe que “o exercício das liberdades [liberdade de expressão, na qual se inclui a liberdade de imprensa] (…) comporta deveres e responsabilidades especiais. Pode, em consequência, ser submetido a certas restrições, que devem, todavia, ser expressamente fixadas na lei e que são necessárias: a) ao respeito dos direitos ou da reputação de outrem; b) à salvaguarda da segurança nacional, da ordem pública, da saúde e da moralidade públicas.” Em suma, a possibilidade de a liberdade de imprensa poder vir a conflituar com outros direitos, designada- mente, com o direito à honra, ao bom nome, à reputação, à intimidade da vida privada, é enfrentada pelo Direito Constitucional de muitos Estados, bem como pelas várias legislações ordinárias nacionais, e ainda pelo Direito Internacional». Nesse contexto, é de admitir, quer à luz do artigo 10.º, n.º 2, da CEDH, quer da Constituição, que o exercício destas liberdades possa ser sujeito, pelo legislador democrático, a certas formalidades e formalismos, condições, restrições ou sanções, desde que possam ser consideradas necessárias, no contexto de uma socie- dade democrática, para prosseguir um conjunto de valores essenciais como a segurança nacional, a segurança pública, a defesa da ordem e a prevenção do crime, a proteção da saúde física ou mental, a proteção da honra ou dos direitos de outrem, ou para garantir a autoridade e a imparcialidade do poder judicial. A possibili- dade de submeter a participação de menores em espetáculos ou programas televisivos a um procedimento administrativo através do qual uma autoridade independente verifica se o superior interesse da criança está a ser respeitado – com o objetivo de proteger a sua saúde e o seu desenvolvimento – enquadra-se neste âmbito. Não ofende uma sociedade democrática a preocupação com o bem-estar das crianças e o controlo jurisdicio- nal da decisão administrativa permite controlar a sua estrita legalidade e constitucionalidade. 25. A verdade é que a norma extraída dos artigos 2.º a 11.º da Lei n.º 105/2009, de 14 de setembro, no sentido de que os menores apenas podem participar em programas de televisão após pedido e concessão de autorização pela CPCJ, não introduz nenhuma restrição à liberdade de expressão e informação constitu- cionalmente consagradas. Com efeito, a liberdade de expressão implica o direito de expressar o pensamento, ou seja, ideias, opi- niões, pontos de vista, juízos de valor, críticas, tomadas de posição sobre quaisquer assuntos, quaisquer que sejam as finalidades e os critérios de valoração. Por sua vez, a liberdade de informação compreende o direito de informar, de se informar e de ser informado. O primeiro consiste no direito de transmitir ou comunicar informações a outrem, sem impedimentos, o segundo no direito de recolha de informação e de procura de fontes de informação e o terceiro no direito de ser mantido adequada e verdadeiramente informado pelos meios de comunicação social e pelos poderes públicos. Há ainda quem, na esteira de Manuel da Costa Andrade ( Liberdade de Imprensa e Inviolabilidade Pessoal – Uma perspetiva jurídico-criminal , Coimbra Edi- tora, 1996, p. 45), refira uma quarta dimensão da liberdade de informação, traduzida numa conceção nega- tiva, ou seja, num direito de recusa a expressar opinião, informar ou ser informado por qualquer indivíduo (cfr. v. g. , o Acórdão n.º 292/08, da 3.ª Secção, ponto 12). Ora a norma em análise ao fazer depender de autorização da CPCJ a participação de menores em pro- gramas de televisão não inibe nenhuma expressão do pensamento, tal como não inibe ou sequer dificulta a possibilidade de transmitir ou comunicar informação a outrem, a possibilidade de recolher informação ou mesmo o direito de ser adequadamente informado pelos meios de comunicação social. A regra nela contida – e só esta cabe agora analisar – limita-se a fazer depender de autorização de uma autoridade vocacionada para a proteção de menores a participação destes em programas de televisão. Dela não decorre a proibição de
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