TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020

181 acórdão n.º 262/20 22. De todo o modo – pode ainda acrescentar-se – a norma em apreciação não representa um enten- dimento jurisdicional dos preceitos constantes dos artigos 2.º a 11.º da Lei n.º 105/2009 que abstraia totalmente da compreensão e caracterização da atividade do menor. Diferentemente do que o enunciado da norma poderia inculcar, a decisão recorrida – o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido em 30 de maio de 2019 (constante de fls. 1204 a 1324 dos autos), não dispensou a identificação da atividade dos menores que exige autorização da CPCJ. Sobre a questão de fazer depender, quer a exibição do pro- grama 3, quer a participação dos menores em programas futuros, de prévia comunicação e de autorização do CPCJ o tribunal, começando por referir que se tratava de uma medida que encontra suporte na lei – a Lei n.º 105/2009, de 14 de setembro, logo adiantou que «para a delimitação do âmbito de aplicabilidade da Lei n.º 105/2009 é relevante, não a qualificação da atividade cultural, artística ou publicitária (elenco visivelmente não taxativo), mas o conceito de espetáculo, central na disposição do artigo 81.º do Código do Trabalho (referida no artigo 1.º) e presente nas disposições do artigo 2.º e 5.º da Lei. A doutrina especializada conflui para que o conceito deve ser entendido num sentido (cada vez mais) lato: basta a exposição perante o público, designadamente por meios audiovisuais, para haver espetáculo (…). Os elementos essenciais e suficientes seriam, pois, a exibição e o público. Ora, neste caso, estão ambos presentes». É certo que o acórdão recorrido não deixa de aludir também à possibilidade de aplicação analógica das medidas previstas na Lei n.º 105/2009 a situações semelhantes, solução que, todavia, apenas adianta para acautelar a eventualidade de uma interpretação da Lei n.º 105/2009 que recusasse a sua aplicabilidade direta a situações como as descritas nos autos, o que não deixaria, todavia, de conduzir ao mesmo resultado decisório. Trata-se, no entanto, de mero obiter dictum , ou argumento ad ostentationem , sem influência efetiva e determinante na decisão concretamente tomada pelo julgador o que sempre inviabilizaria o seu conheci- mento por via de recurso para o Tribunal Constitucional (cfr. Carlos Lopes do Rego, Os Recursos de Fiscali- zação Concreta na Lei e na Jurisprudência do Tribunal Constitucional, p. 110). iii) A invocada restrição inconstitucional à liberdade de expressão e informação 23. Por fim, alega ainda a recorrente que a referida interpretação representa uma restrição excessiva da liberdade de expressão e informação (em especial, dos operadores e produtores televisivos), na medida em que impõe uma limitação ou condicionamento à difusão de um programa televisivo, a ser determinada pela decisão de uma autoridade de natureza administrativa. Mais uma vez, não tem razão. 24. A liberdade de expressão e de informação ocupa um lugar central na garantia e desenvolvimento de uma sociedade democrática e pluralista como a República Portuguesa. O Direito Internacional assegura estes direitos em vários textos fundamentais como no artigo 19.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos ou no artigo 19.º, n.º 2, do Pacto Internacional sobre os Direi- tos Civis e Políticos. Nos termos do Direito da UE, o direito à liberdade de expressão inclui a liberdade de opinião e de receber e transmitir informações e ideias sem interferência da autoridade pública e independentemente das fronteiras (artigo 11.º da Carta dos Direitos Fundamentais da UE). No contexto específico do Conselho da Europa, a liberdade de expressão é garantida pelo artigo 10.º da CEDH e só pode ser limitada se a limita- ção for prescrita por lei, prosseguir um dos objetivos legítimos enumerados no n.º 2 daquele preceito e for necessária numa sociedade democrática. Na sua jurisprudência, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) salientou que a liberdade da expressão constitui um dos fundamentos essenciais de uma sociedade democrática, uma das condições básicas para o seu progresso e para o desenvolvimento de todas as pessoas, sendo aplicável não só à “informação” ou às “ideias” que são favoravelmente recebidas ou consideradas como inofensivas ou indiferentes, mas também às que ofendem, chocam ou perturbam o Estado ou qualquer

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