TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
150 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Foi neste preciso sentido que se admitiu, no referido Acórdão n.º 150/19, o recurso por referência à norma contida no artigo 79.º, n.º 1, do Código Penal, interpretado no sentido de, perante continuação criminosa, a determinação do regime jurídico-penal aplicável [aqui entendido, como vimos, no sentido de lei aplicável em caso de sucessão de leis penais, designadamente para efeitos de verificação da prescrição do procedimento criminal] operar por referência à data do último facto integrante da continuação, independen- temente de esta integrar factos anteriores de maior gravidade. Estando em causa tal específica dimensão não cabe ao Tribunal Constitucional, designadamente, quali- ficar factos concretos como mais ou menos graves, situá-los na vigência do RJIFNA ou do RGIT, nem sequer aceitar tais qualificações, pois não vêm pressupostas na norma sub judice . 2.2. Prevê o artigo 30.º, n.º 2, do Código Penal: Artigo 30.º Concurso de crimes e crime continuado 1 – O número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efetivamente cometidos, ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente. 2 – Constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente. 3 – O disposto no número anterior não abrange os crimes praticados contra bens eminentemente pessoais. Como esclarece Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal – Parte Geral, 3.ª edição (com a colaboração de Maria João Antunes, Susana Aires de Sousa, Nuno Brandão e Sónia Fidalgo), Coimbra, 2019, p. 1193/§41: “[…] Aqui se revela o propósito da lei de tratar, sob um ponto de vista particular que em seguida se explicitará, um concurso de crimes efetivo no quadro da unidade criminosa, de uma ‘unidade criminosa’ normativamente (legal- mente) construída. E, coerentemente, o propósito de subtrair a punição às regras da punição do concurso de crimes e submetê-la a um regime adequado à consideração do caso como de unidade de crime (artigo 70.º). […]”. Assenta esta figura na verificação de uma situação de menor exigibilidade, que (prossegue o mesmo Autor, ob. cit. , p. 1200/§48): “[…] [S]erve para conferir àquela, pelo menos na generalidade dos casos, uma unidade do sentido de desvalor do ilícito do comportamento global (normativamente construída, é certo) e, por aí, para justificar a subtração de tais casos à forma de punição contida no artigo 77.º. […] [N]ão fosse a relação de continuação e a unificação normativa que ela determina e, é exato, depararíamos naquela relação, ao menos por regra, com hipóteses de concurso efetivo ou puro. […]”. Em suma, nas palavras de M. Miguez Garcia e J. M. Castela Rio, Código Penal – Parte geral e parte espe- cial, com notas e comentários, 2.ª edição, Coimbra, 2015, p. 236, “[n]uma visão material das coisas, o crime continuado é uma unidade jurídica construída sobre uma pluralidade efetivo de crimes”. É, pois, por referência a esta figura que o artigo 79.º, n.º 1, do Código Penal (preceito que contém a norma posta em crise pelo recorrente) prevê que “[o] crime continuado é punível com a pena aplicável à conduta mais grave que integra a continuação”.
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