TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 108.º Volume \ 2020
132 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL IV - Não se identifica, no caso da norma em apreciação, nenhum direito fundamental que seja restringido, não existindo um direito fundamental absoluto a conduzir veículos a motor, designadamente na via pública, independentemente da verificação da aptidão da pessoa para a condução; trata-se de uma atividade dependente da atribuição de licença ou carta de condução e está depende da verificação de requisitos positivos e negativos estabelecidos pelo legislador, pelo que não existindo uma restrição de um direito fundamental, não existe razão para mobilizar o princípio da proporcionalidade com este fundamento. V - Independentemente da restrição de um direito fundamental, o princípio da proporcionalidade ou da proibição do excesso ainda é convocável enquanto princípio geral de direito conformador dos atos do poder público, decorrente do princípio do Estado de direito – de onde decorre a proibição do excesso, da atuação arbitrária ou injusta do Estado, da adoção de soluções desnecessárias ou excessivamente onerosas ou restritivas –, sendo a essa luz que a questão de constitucionalidade se pode colocar, no sentido de saber se a imposição de um período de dois anos sobre a efetivação da cassação da carta durante o qual não pode ser obtido novo título de condução, imposto no n.º 11 do artigo 148.º do Código da Estrada, não violará a proibição do excesso, e se respeita todas as dimensões do princípio da proporcionalidade, designadamente os subprincípios da adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito. VI - A fixação de um período sobre a cassação da carta apresenta-se como uma medida idónea para salva- guardar o interesse público da segurança rodoviária, prevenindo o perigo resultante da condução na via pública por parte de condutores que não apresentam a aptidão necessária para o efeito, ao mesmo tempo que permite ao condutor inabilitado de refletir sobre a inadequação da conduta estradal ante- rior e colher a instrução e ensinamentos necessários ao aperfeiçoamento da sua aptidão como futuro condutor, não sendo apresentados argumentos que permitam censurar o legislador por desprezar medidas menos gravosas que pudessem produzir o mesmo efeito com o mesmo grau de eficácia. VII - Quanto ao último teste – a ponderação da proibição de obtenção de título de condução durante dois anos após a cassação, naturalmente onerosa para a pessoa em causa, com o interesse público da segurança rodoviária e da prevenção do risco para a sociedade decorrente da condução de um veículo motorizado por um agente que não cumpre as regras da estrada –, a duração de dois anos prevista não se apresenta como excessiva tendo em conta que o título de condução habilita a conduzir veículos a motor na via pública, atividade que exige competência técnica que pressupõe um juízo prévio de aptidão para o seu exercício, e que o condutor que vê a sua carta cassada revelou a perda dessa aptidão; nessa situação, demanda algum tempo a recuperação das condições que poderão habilitar a pessoa de novo a conduzir, o que não dispensa um reforço da consciência pessoal sobre a natureza e perigos da atividade de condução, bem como a sedimentação da aprendizagem das regras do Código da Estrada, não se apresentado, neste contexto, a imposição de um período de dois anos entre a efetivação da cassação da carta e a concessão de novo título de condução, como uma medida excessiva ou desequi- librada.
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