TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
684 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL recorrentes, ignoraram a vontade dos militantes locais e violaram normas estatutárias, contrariando os prin- cípios do Partido Socialista. Adiante-se a improcedência do recurso, que se mostra manifesta. 7. Com efeito, e desde logo, não incumbe a este Tribunal apreciar outras deliberações tomadas pelo Par- tido Socialista, a montante das deliberações punitivas proferidas em 14 de março de 2019, aqui impugnadas ao abrigo do n.º 1 do artigo 103.º-D da LTC. A esta conclusão não obsta a invocação de uma (pretérita) violação estatutária na designação dos can- didatos ao ato eleitoral autárquico de 2017, traduzindo infração grave das regras essenciais relativas ao fun- cionamento democrático do partido. Caso assim entendessem, assistia aos recorrentes a faculdade de impul- sionar os meios de impugnação interna que os Estatutos lhes conferem e, eventualmente, caso decaíssem nas suas pretensões, a possibilidade de acesso ao Tribunal Constitucional pela via prevista no n.º 2 do artigo 103.º-D da LTC, o que escolheram não fazer. Afastada ficou então, por força dessa opção, a discussão da matéria em sede contenciosa, mormente na presente ação. 8. De todo o modo, e como bem se decidiu no Acórdão recorrido, a apreciação e valoração da motivação política subjacente à conduta disciplinarmente censurada, nos termos em que é apresentada – discordância sobre a composição das listas de candidatos aprovadas pelos órgãos partidários competentes – importaria a sindicância do mérito de opções essencialmente políticas tomadas por um partido político, situadas no âmago da liberdade de ação política que assiste a tais associações, cognição claramente incompatível com o respeito pelo princípio da intervenção mínima, o qual norteia todo o controlo cometido ao Tribunal Cons- titucional em matéria de impugnação de deliberações dos partidos políticos, incluindo no domínio punitivo. Em síntese da jurisprudência constitucional sobre a matriz de intervenção mínima que rege o controlo cometido ao Tribunal em matéria de contencioso partidário, diz-se no Acórdão n.º 177/19: «5. A jurisprudência constitucional tem considerado que, no âmbito dos processos impugnatórios visando deliberações dos órgãos partidários, vale (...) o princípio da intervenção mínima, que funciona como um critério geral orientador do sentido e da medida de sindicância confiada ao Tribunal Constitucional. Este princípio de auto-contenção da intervenção fiscalizadora do Tribunal Constitucional materializa o resul- tado da concordância prática entre a autonomia associativa e partidária – que implica um grau de liberdade organizacional que permita a construção e manutenção da “idiossincracia identitária de um partido” (Acórdão n.º 178/17) – e a necessidade de garantir que a atividade dos partidos, atenta a sua função estruturante num Estado de direito, se processe de acordo com os limites estabelecidos na Constituição da República Portuguesa, nomea- damente com respeito pelos princípios essenciais da transparência, da organização, da gestão democrática e da participação de todos os seus membros (artigo 51.º, n.º 5). A este propósito, pode ler-se, no Acórdão n.º 497/10: “Não obstante concorrerem para a organização e para a expressão da vontade popular (artigo 10.º, n.º 12, da CRP), e deterem por isso funções e competências relevantes no domínio da organização do poder polí- tico (artigos 114.º; 151.º, n.º 1; 180.º da CRP), os partidos políticos são, na sua raiz, expressão do exercício da liberdade de associação. Nesses termos, e conforme o reconhece a Constituição nos artigos 51.º e 46.º, gozam, na ordenação da sua vida interna, da autonomia própria que é conferida às associações. É certo que tal autonomia conhece sempre limites, impostos pela ordem constitucional no seu conjunto. Para além daqueles que valem, em geral, para todas as associações, são aplicáveis à ordenação da vida interna dos partidos, pelas funções políticas que constitucionalmente são conferidos a estes últimos, não apenas os limites decorrentes do necessário respeito pelos princípios da independência nacional, da unidade do Estado e da democracia política (n.º 2 do artigo 10.º), mas ainda os decorrentes dos princípios da transparência, da organização e da gestão democrática e da participação de todos os seus membros (n.º 5 do artigo 51.º). É em razão destes limites, que
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