TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
669 acórdão n.º 3/20 Nos termos do artigo 3.º, n.º 1, da LORL, o referendo local só pode ter por objeto questões de relevante interesse local. Os feriados destinam-se à celebração coletiva de datas ou eventos significativos no plano político, cul- tural, social ou religioso da comunidade de referência, reafirmando os valores que deles relevam e assegu- rando a sua inscrição na memória coletiva. No plano local, os feriados tanto tendem a celebrar momentos constitutivos da comunidade – v. g. , outorga de forais, elevação a vila ou cidade, restauração do município −, como podem coincidir com datas das festas religiosas tradicionais na circunscrição territorial, nomeada- mente a celebração do padroeiro da terra. Daí que a possibilidade de mudança da data do feriado municipal se afigure constituir uma questão de relevante interesse local; trata-se de definir um referente importante da identidade coletiva. Não se vislumbra que a eventual modificação da data do feriado municipal contenda com os princí- pios da unidade e subsidiariedade do Estado, da descentralização, da autonomia local e da solidariedade interlocal, para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 3.º da LORL. Nem se trata de matérias excluída de referendo local, nos termos do artigo 4.º da LORL. Conclui-se, assim, que a matéria submetida a consulta popular é referendável a nível local. 10. Cabe agora apreciar se a pergunta formulada reúne as exigências legais. Dispõe o artigo 7.º, n.º 1, da LORL que nenhum referendo pode comportar mais do que três pergun- tas. Trata-se de uma exigência respeitada no caso vertente, visto que a deliberação incide sobre uma única pergunta. Mostra-se igualmente verificada a condição prevista no n.º 3 do artigo 7.º do mesmo diploma, segundo a qual as perguntas não podem ser precedidas de quaisquer considerandos, preâmbulos ou notas explicativas. Nos termos do n.º 2 do mesmo artigo, «as perguntas são formuladas com objetividade, clareza e precisão e para respostas de sim ou não, sem sugerirem direta ou indiretamente o sentido das respostas». Vejamos mais em pormenor estes requisitos. Por um lado, o quesito referendário tem de ser formulado de modo a admitir exclusivamente as respos- tas sim ou não, de acordo com a natureza dilemática ou bipolar da consulta popular (vide, entre muitos, o Acórdão n.º 360/91). Por outro lado – como se sublinha no Acórdão n.º 288/98 –, «a clareza da pergunta há de conjugar-se com a sua objetividade e precisão, o que implica uma maior complexidade e a utilização de terminologia rigorosa, para se evitar, posteriormente, a existência de equívocos quanto às soluções propugnadas, por a pergunta abranger situações não pretendidas ou consentir leituras ambíguas». A aferição destes critérios deve ter em conta o eleitor mediano ou típico; «fazendo apelo a um paralelismo com a teoria da impressão do destinatário, o horizonte para aferir a compreensão das perguntas há de ser o cidadão eleitor normal, sem conhecimentos especializados nas matérias sobre que é inquirido» (Acórdão n.º 531/98). 11. Recorde-se que a pergunta é a seguinte: «Concorda em manter a data do feriado municipal de Vizela no dia 19 de março em vez de a alterar para o dia 11 de julho?» Tenha-se presente que a consulta popular se destina a determinar a preferência dos munícipes de Vizela quanto à data do feriado municipal, colocando-se duas possibilidades. Em substância, a questão da preferên- cia por uma ou a outra data, sendo embora disjuntiva, não é de sim ou não. Sucede que o quesito referen- dário está formulado de modo a admitir exclusivamente uma resposta deste último tipo, como exige o n.º 2 do artigo 7.º da LORL. Vejamos agora se a pergunta é suficientemente clara, objetiva e precisa. O eleitor não é questionado apenas sobre a sua concordância com a data atual do feriado municipal. A resposta negativa a uma tal pergunta seria irremediavelmente ambígua, porque não exprimiria a preferência por uma alternativa determinada; só assim não seria se o universo de possibilidades fosse bivalente, o que não é o caso. Porém, a pergunta formulada fixa claramente a alternativa à data atual através da cláusula de
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