TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

660 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL A decisão recorrida é o despacho do relator no Tribunal da Relação do Porto, datado de 12 de fevereiro de 2020, que indeferiu o pedido de consulta do apenso em que se tramitava o recurso incidente sobre a medida de coação aplicada ao arguido. De acordo com o requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade, fundado na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, o objeto é a «inconstitucionalidade da interpretação efetuada do artigo 89.º n.º 1 do Código de Propcesso Penal, no sentido de que o recorrente não pode consultar diretamente, via confiança, o APENSO do recurso onde se discute urna prisão preventiva, para responder ao parecer do M.º P.º no mesmo, depois de lhe terem sido fornecidas todas as cópias a que alude o artigo 194.º, n.º 8, do CPP». O tribunal a quo não admitiu o recurso por considerar que o despacho de 12 de fevereiro de 2020, que indeferiu a consulta do apenso do processo com fundamento na sua sujeição a segredo de justiça, é «legal- mente taxado de irrecorrível», nos termos do artigo 89.º, n.º 2, do Código de Processo Penal. O fundamento é manifestamente infundado. A irrecorribilidade a que respeita o artigo 89.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, vale apenas para os recursos ordinários, obstando a que o mérito da decisão seja reapreciado por uma instância superior na mesma ordem jurisdicional. Como se sublinhou no Acórdão n.º 125/20, referido pelo Ministério Público neste Tribunal Consti- tucional, os pressupostos do recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade são os especificamente fixados na LTC, não coincidindo com os que regulam a recorribilidade das decisões na ordem jurisdicional em que se inserem. Ora, precisamente a irrecorribilidade ordinária da decisão é, segundo o disposto no n.º 2 do artigo 70.º da LTC, um dos pressupostos específicos do recurso de constitucionalidade interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do mesmo artigo. Trata-se de um corolário do carácter subsidiário da pronúncia da jurisdição constitucional − a qual, de resto, apenas reaprecia a decisão recorrida na medida em que esta incide sobre uma questão de constitucionalidade normativa, não tendo o Tribunal Constitucional poderes de cognição quanto às demais questões jurídicas que se colocam no processo. 9. Segundo o disposto no n.º 4 do artigo 77.º da LTC, a decisão que julgue a reclamação de despacho que indefira o recurso de constitucionalidade ou que retenha a sua subida não pode ser impugnada e, caso a reclamação seja deferida, faz caso julgado quanto à admissibilidade do recurso. Significa isto que, no julgamento da reclamação, importa considerar não só os fundamentos em que repousa a decisão de não admissão ou de retenção do recurso de constitucionalidade, como ainda aferir da verificação dos demais pressupostos de admissibilidade do recurso. Dito de outro modo: o julgamento da reclamação deverá não só incidir sobre o fundamento do despacho de não admissão ou de retenção do recurso de constitucionalidade, como sobre quaisquer outras razões que obstem ao conhecimento do objeto de tal recurso. Isto porque o deferimento da reclamação implica a preclusão dos poderes cognitivos do Tri- bunal em matéria de não admissão do recurso, nos termos do artigo 77.º, n.º 4, da LTC, formando-se caso julgado formal quanto a tal matéria. Vejamos então se existe algum outro fundamento que implique a não admissão do recurso, para além do invocado na decisão reclamada. 10. Poderia argumentar-se que o recorrente não deu satisfação ao ónus processual imposto pelo artigo 72.º, n.º 2, da LTC, segundo o qual, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, cabe recurso para oTribu- nal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo. Suscitação que deve ter ocorrido de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer (artigo 72.º, n.º 2, da LTC). Sendo a decisão recorrida o despacho do relator no Tribunal da Relação do Porto, de 12 de fevereiro de 2020, é de notar que a suscitação da questão de constitucionalidade apenas teve lugar no requerimento em que se reclamou para a conferência. Ora, a conferência não chegou a apreciar a questão, porque o relator não admitiu a reclamação e reiterou o despacho impugnado.

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