TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

651 acórdão n.º 256/20 do Ministério Público). Nessa medida, aquele efeito extintivo apresenta-se como um plus relativamente ao mal da pena acessória e que, sem dúvida alguma, pode perturbar a readaptação social do condenado. E isto acontece sem que se atenda ao princípio da culpa e ao princípio da proporcionalidade. Com efeito, o artigo 98.º, alínea b) , do EMGNR, ao consagrar a cessação definitiva do vínculo à Guarda no seguimento da condenação numa pena acessória de proibição do exercício de função, acaba por ultra- passar o sentido desta última, uma vez que, nos termos do artigo 66.º, n.º 1, do Código Penal, tal pena se apresenta sempre com um carácter temporário, e não necessariamente expulsivo. A norma daquele preceito acaba, assim, por esvaziar, em larga medida, as ponderações realizadas em sede de fixação da medida da pena acessória, porquanto transforma esta última sempre em mero pressuposto de uma consequência única, neces- sária e de aplicação automática: a cessação definitiva do vínculo à GNR. E isto acontece sem que se consiga divisar um qualquer fundamento razoável para tal. Na verdade, não se descortinam quaisquer fundamentos válidos, à luz do interesse público, para que, no que respeita aos militares da GNR, se converta a pena de proibição do exercício de função, que tem um carácter temporário, numa pena de cessação definitiva do vínculo, pondo em causa os princípios fundamen- tais da política criminal, como o princípio da culpa, o princípio da necessidade da pena e o princípio da jurisdicionalidade da aplicação do direito penal. Tanto mais, que a aplicação de tal sanção acessória não só se pode enquadrar no âmbito do EMGNR enquanto inatividade temporária, como não preclude a possibili- dade de exercer o poder disciplinar e de eventualmente, caso a gravidade da conduta do militar o justifique, aplicar em sede disciplinar uma sanção expulsiva: a separação do serviço. Conclui-se, por isso, que a norma da alínea b) do artigo 98.º do EMGNR, ao determinar que o militar que tenha sido condenado na pena acessória de proibição do exercício de função cessa definitiva e de forma automática (ou seja, sem qualquer mediação ponderadora numa decisão administrativa concreta) o vínculo à GNR, é incompatível com o disposto no artigo 30.º, n.º 4, da Constituição.  III – Decisão Pelo exposto, decide-se: a) Julgar inconstitucional, por violação do artigo 30.º, n.º 4, da Constituição, a norma do artigo 98.º, alínea b) , do Decreto-Lei n.º 30/2017, de 22 de março, correspondente ao Estatuto dos Militares da GNR, segundo a qual cessa definitivamente o vínculo à Guarda o militar que tenha sido conde- nado na pena acessória de proibição do exercício de função; e, em consequência, b) Negar provimento ao recurso. Sem custas. Lisboa, 29 de abril de 2020. – Pedro Machete – Fernando Vaz Ventura – Mariana Canotilho – Manuel da Costa Andrade. Anotação: 1 – Acórdão publicado no Diário da República, II Série, de 8 de julho de 2020. 2 – Os Acórdãos n. os 16/84, 127/84 e 310/85 estão publicados em Acórdãos, 2.º, 4.º e 6.º Vols., respetivamente. 3 – Os Acórdãos n. os 165/86, 353/86 e 255/87 estão publicados em Acórdãos, 7.º, 8.º e 9.º Vols., respetivamente. 4 – Os Acórdãos n. os 284/89, 748/93, 522/95 e 327/99 estão publicados em Acórdãos, 13.º, 26.º, 32.º e 43.º Vols., respeti- vamente. 5 – Os Acórdãos n. os 202/00, 562/03 e 154/04 estão publicados em Acórdãos, 47.º, 57.º e 58.º Vols., respetivamente. 6 – Os Acórdãos n. os 239/08, 368/08 e 25/11 estão publicados em Acórdãos, 71.º, 72.º e 80.º Vols., respetivamente. 7 – Os Acórdãos n. os 748/14, 132/18 e 376/18 estão publicados em Acórdãos, 91.º, 101.º e 102.º Vols., respetivamente.

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