TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
648 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Por outro lado, considera-se que as razões da consagração deste preceito valem tanto para o direito penal, como para os demais domínios sancionatórios de natureza administrativa. Como resulta do Acórdão n.º 368/08, tal preceito «visa salvaguardar que qualquer sanção penalizadora da conduta punida, indepen- dentemente da sua natureza e medida, resulte da concreta apreciação, pela instância decisória, do desvalor dessa conduta, por confronto com os padrões normativos aplicáveis» (n.º 5; em idêntico sentido, vide, por exemplo, os Acórdãos n. os 327/99, 239/08 e 25/11). Finalmente, no domínio da carreira dos militares da GNR ou de carreiras profissionais próximas, é de mencionar a jurisprudência constitucional quanto à perda de direitos profissionais. Assim, o Tribunal Cons- titucional tem entendido que integram o conceito de “perda de direitos profissionais”, para efeito do disposto no artigo 30.º, n.º 4, da Constituição, as seguintes situações: – Demissão (Acórdão n.º 165/86 que, na sequência dos Acórdãos n. os 16/84 e 127/84, declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do Código de Justiça Militar de 1977, que impunha a demissão de oficial ou sargento dos quadros permanentes ou de praças em situação equivalente como efeito necessário da sua condenação pelos crimes aí referidos); – Baixa de posto (Acórdão n.º 255/87, que julgou inconstitucional a norma do Código de Justiça Militar, que impõe a baixa de posto dos oficiais ou sargentos que pertençam ao quadro de comple- mento como consequência da condenação por determinados crimes); – Entraves à progressão na carreira (Acórdão n.º 562/03, que declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do EMGNR então vigente, que impedia a promoção a determi- nado posto, como consequência automática da aplicação de determinadas sanções disciplinares). 4. A sentença recorrida acolheu os fundamentos do mencionado Acórdão n.º 165/86, que apreciou a constitucionalidade do artigo 37.º, n.º 1, do Código de Justiça Militar: «A condenação de oficial ou sargento dos quadros permanentes ou de praças em situação equivalente por crime de ultraje à bandeira nacional, deserção, falsidade, infidelidade no serviço, furto, roubo, prevaricação, corrupção, burla e abuso de confiança produz a demissão, qualquer que seja a pena imposta.» No referido Acórdão pode ler-se: «[O] militar condenado em qualquer das penas referidas no artigo 37.º, n.º 1, do Código de Justiça Militar fica automaticamente, e independentemente de condenação específica, privado do seu lugar no respetivo quadro – isto é, do seu «emprego» –, do seu título profissional e, bem assim, do direito a quaisquer recompensas e pensões. Não há, assim, a menor dúvida de que o preceito questionado liga às penas nele previstas um efeito automático e necessário, que se traduz na perda de direitos profissionais – e, antes de mais, logo do direito profissional verda- deiramente nuclear [e fundamental (cfr. artigos 53.º e 47.º, n.º 2, da Constituição)], que é o direito ao próprio emprego, legitimamente obtido. 6 – Ora, um resultado destes está absolutamente interdito pelo artigo 30.º, n.º 4, da Constituição. […] Tudo isto – que agora se resume – foi já amplamente exposto no Acórdão n.º 16/84 deste Tribunal. Como aí se salientou, “no fundo, o n.º 4 do artigo 30.º da Constituição deriva, em linha reta, dos primordiais principais definidores da atuação do Estado de direito democrático que estruturam a nossa Lei Fundamental, ou sejam os princípios do respeito pela dignidade humana (artigo 1.°) e os do respeito e garantia dos direitos fundamentais (artigo 2.°)”. E continua-se: “Daí decorressem os grandes princípios constitucionais de política criminal: o prin- cípio da culpa; o princípio da necessidade da pena ou das medidas de segurança; o princípio da legalidade e o da jurisdicionalidade da aplicação do direito penal; o princípio da humanidade; e o princípio da igualdade”. “Ora” conclui-se “se da aplicação da pena resultasse, como efeito necessário, a perda de quaisquer direitos civis, profis- sionais ou políticos, far-se-ia tábua rasa daqueles princípios, figurando o condenado como um proscrito, o que constituiria um flagrante atentado contra o princípio do respeito pela dignidade da pessoa humana”»
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