TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

647 acórdão n.º 256/20 Está em causa prevenir o que poderia ser perspetivado como uma “morte” civil, profissional ou política do cidadão condenado, impeditiva da sua reinserção social após o cumprimento da pena (no mesmo sentido, vide também os Acórdãos n. os 16/84, 310/85, 75/86, 94/86, 284/89, 748/93, 522/95, 327/99, 202/00 e 262/03). Com efeito, a proibição da automaticidade dos efeitos das penas pretende obviar a que, por mero efeito da lei, se produzam efeitos que, sem atender aos princípios da culpa e da proporcionalidade, envolvam a perda de direitos civis, profissionais e políticos. Nesse sentido, afirmou-se no Acórdão n.º 239/08: «Na verdade, ao estabelecer-se um nexo consequencial entre a aplicação duma pena e a perda de direitos civis, profissionais ou políticos, alguns dos princípios que presidem à aplicação das penas devem também estar presentes na aplicação daquelas medidas, nomeadamente os princípios da culpa, da necessidade e da proporcionalidade, pelo que é imprescindível a mediação de um juízo que avalie os factos praticados e pondere a adequação e a necessidade de sujeição do condenado a essas medidas, não podendo as mesmas resultarem ope legis da simples condenação penal (vide, neste sentido, Damião da Cunha, em Constituição Portuguêsa anotada , dirigida por Jorge Miranda e Rui Medeiros, tomo I, pp. 337-338, da edição de 2005, da Coimbra Editora).» (n.º 2 da Fundamentação) Do mesmo modo, refere-se no Acórdão n.º 748/14: «Ora, tal proibição, como é consabido, pretende impedir que haja um efeito automático de condenação penal nos direitos civis, profissionais e políticos do arguido. A sua justificação é simultaneamente a de obviar ao efeito estigmatizante e criminógeno das penas e de impedir a violação dos princípios da culpa e da proporcionalidade, que impõem uma ponderação, em concreto, da adequação do efeito em causa à gravidade do ilícito, afastando a possibilidade de penas fixas (cfr. o Acórdão n.º 461/00, disponível em www.tribunalconstitucional.pt ) » (n.º 4) E, ainda, no Acórdão n.º 132/18: «É este o sentido em que deve ser lido o artigo 30.º, n.º 4, da CRP. Ou seja, e em síntese, ele “(…) não proíbe a consagração de penas que se traduzam na perda de direitos civis, mas sim que da simples condenação anterior o legislador retire automaticamente esse efeito, sem mediação do julgador” (Acórdão n.º 53/11; v. ainda o Acórdão n.º 239/08), “(…) com tal preceito constitucional pretendeu-se proibir que, em resultado de quaisquer condena- ções penais, se produzissem automaticamente, pura e simplesmente ope legis , efeitos que envolvessem a perda de direitos civis, profissionais e políticos e pretendeu-se que assim fosse porque, em qualquer caso, essa produção de efeitos, meramente mecanicista, não atenderia afinal aos princípios da culpa, da necessidade e da jurisdicionalidade, princípios esses de todo inafastáveis de uma Lei Fundamental como a Constituição da República Portuguesa que tem por referente imediato a dignidade da pessoa humana” (Acórdão n.º 284/89).» (n.º 2.2 da Fundamentação) Assim, para efeitos do artigo 30.º, n.º 4, da Constituição, constitui efeito necessário ou automático da pena todo aquele que decorre diretamente da lei (efeito ope legis ), todo aquele que não pressupõe que se façam quaisquer juízos de valoração ou de ponderação face à situação concreta e todo aquele que, consequen- temente, não permite a aferição da culpa face à gravidade do ilícito praticado. A par destes aspetos, deve dar-se conta de que, em concretização do alcance do preceito, a jurisprudência constitucional tem entendido que os efeitos necessários das penas se estendem também, por identidade de razão, aos efeitos automáticos ligados à condenação pela prática de certos crimes. Nesse sentido, afirma-se no Acórdão n.º 376/18: «Ora, neste âmbito, o Tribunal Constitucional tem reiteradamente admitido a aplicação do n.º 4 do artigo 30.º da CRP a casos nos quais a perda de direitos é configurada, pelo legislador, como um efeito necessário da condenação pela prática de um crime, aderindo, pois, ao entendimento de que esse parâmetro normativo não se encontra limitado às normas que preveem um efeito automático decorrente da aplicação de uma pena (cfr., entre outros, os Acórdãos n.º 91/84, 282/86, 284/89, 522/95, 327/99, 76/00, 87/00, 405/01 e 562/03, 239/08 e 368/08).» (n.º 11)

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