TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
641 acórdão n.º 255/20 DECLARAÇÃO DE VOTO Votei o sentido da decisão, com o qual concordo. Divirjo, porém, em pontos essenciais, da fundamen- tação, por razões que passo, sinteticamente, a explicar. Antes de mais, discordo da qualificação da contribuição da entidade empregadora para a CGA (ou seja, em termos latos, para o sistema de segurança social, globalmente considerado, já que a contribuição em causa, no caso concreto, configura uma parcela da contribuição total da entidade empregadora, que se divide por dois subsistemas) como um imposto. Este Tribunal reafirmou recentemente, no seu Acórdão n.º 344/19, que “a qualificação de um tributo como imposto, por contraposição ao conceito constitucional de taxa, reside na análise do seu pressuposto e da respetiva finalidade: «o imposto constitui uma prestação pecuniá- ria, coativa e unilateral, exigida com o propósito de angariação de receitas que se destinam à satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas, e que, por isso, tem apenas a contrapartida genérica do funcionamento dos serviços estaduais»”. Parece-me, por isso, desadequada a caraterização da contribuição entidade empregadora nestes termos, uma vez que não vejo como possa afirmar-se que aquelas não retirem – ou, pelo menos, que não possam retirar – quaisquer contrapartidas específicas decorrentes da existência de um sistema de segurança social. De facto, a existência de um sistema de segurança social, desenhado nos termos constitucionalmente exigidos, comporta inequívocas vantagens não apenas para os trabalhadores, enquanto beneficiários diretos das prestações sociais, mas também para as respetivas entidades empregadoras. Vantagens estas que não se confundem, em nenhuma circunstância, com uma qualquer contrapartida genérica de bom funcionamento dos serviços públicos ou das instituições do Estado, mas que constituem ganhos particulares, intrinseca- mente relacionados com o papel que aquelas entidades desempenham, enquanto agentes económicos. Em primeiro lugar, e em termos gerais, o sistema de segurança social tem, através das prestações que atri- bui aos trabalhadores (e que, por isso, têm uma ligação indesmentível à existência de um vínculo entre uma pessoa e uma entidade empregadora) – designadamente, os subsídios de desemprego, doença e maternidade ou paternidade –, importantes consequências macroeconómicas. Essas consequências são particularmente visíveis em períodos de crise, durante os quais as prestações de segurança social contribuem, de forma auto- mática, para a estabilização da economia – o que é particularmente importante para as associações e empresas que atuam no mercado. Por outro lado, a existência de um sistema de segurança social permite uma reparti- ção de alguns dos riscos inerentes à relação de emprego de uma forma que desonera a entidade empregadora de obrigações que, em países não dotados de tal solução, ou correm por conta dos empregadores, ou deixam os trabalhadores totalmente desprotegidos, sem qualquer tipo de apoio em caso de incapacidade temporária ou definitiva para o trabalho, solução também problemática a vários níveis (veja-se, neste sentido, o recente trabalho de Joseph Stiglitz, Rewriting the Rules of the European Economy, W. W. Norton & Company, 1.ª edição, 2020, pp. 240 e seguintes). Além disso, e em termos particulares, no quadro do ordenamento jurídico nacional, as entidades empre- gadoras podem beneficiar de medidas específicas de segurança social, ou seja, prestações que lhes são dire- tamente atribuídas, especialmente em situações de crise. Vejam-se, por exemplo, as medidas recentemente adotadas pelo Decreto-Lei n.º 10-G/2020, de 26 de março, que define como direitos do empregador (artigo 4.º): i) apoio extraordinário à manutenção de contrato de trabalho, com ou sem formação, em caso de redu- ção temporária do período normal de trabalho ou da suspensão do contrato de trabalho, nos termos dos artigos 298.º e seguintes do Código do Trabalho ( lay-off ); ii) plano extraordinário de formação; iii) incentivo financeiro extraordinário para apoio à normalização da atividade da empresa; iv) isenção temporária do pagamento de contribuições para a Segurança Social, a cargo da entidade empregadora. Estas medidas, que consistem, antes de mais, em apoios financeiros atribuídos às entidades empregadoras, pressupõem, desde logo, a existência de um sistema de segurança social, lato sensu , e, em segundo lugar, a qualidade de elemento integrante do sistema, enquanto contribuinte.
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