TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

634 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Na perspetiva de que o sistema previdencial integra hoje o quadro de um mais vasto direito à segurança social, não se limitando, como sucedeu nas suas origens, a representar uma modalidade de seguro social, com- preende-se a conclusão de Casalta Nabais, a propósito das funções estaduais em matéria de segurança social: «[S]e esta for entendida, como o foi durante muito tempo, assunto que diz respeito sobretudo a cada um dos cidadãos, facilmente se aceita que as contribuições, que cada um realizar para lhe fazer face, não sejam consideradas impostos. Mas se a segurança social for concebida como um direito de todos os cidadãos, abrangendo inclusiva- mente os que para ela não podem contribuir, como o faz o art. 63.º, n.º 1, da nossa Constituição, que assim a concebe como um “bem público por imposição constitucional”, então já não haverá obstáculos a considerar as contribuições para a segurança social impostos ou, pelo menos, para aceitar a sua equiparação aos impostos, como defende a generalidade da nossa doutrina e jurisprudência» (v. Autor cit., Direito Fiscal, 9.ª edição, Almedina, Coimbra, 2016, pp. 594-595). Sérgio Vasques não vai tão longe, por ainda reconhecer, apesar de todos os entorses, uma relevância decisiva ao princípio contributivo, enquanto expressão do princípio da equivalência: «Em conformidade com o artigo 54.º da Lei de Bases e o artigo 18.º do Código Contributivo, o sistema pre- videncial assenta numa regra de contributividade, querendo isto dizer que o direito às prestações substitutivas dos rendimentos fica subordinado ao cumprimento da obrigação legal de contribuir. A condição elementar de acesso à proteção que é garantida pelo sistema previdencial reside, assim, no cumprimento das obrigações contributivas pelos próprios trabalhadores que dela pretendam beneficiar, podendo-lhes mesmo ser exigido o decurso de um período mínimo de contribuição. Em contrapartida, estas contribuições não constituem encargos que se destinem a alimentar prestações solidarísticas de que seja potencial beneficiária toda a comunidade, destinando-se, isso sim, a financiar prestações substitutivas dos rendimentos dos próprios trabalhadores, ocorridas as eventualidades [pre- vistas]. O que se desprende da adequação seletiva e da contributividade, portanto, é que se a segurança social [é] um direito que é de todos, não são as contribuições a cargo dos trabalhadores que financiam as prestações a que todos têm direito. [S]eria erróneo, por isso, qualificar as contribuições para a segurança social a cargo dos trabalhadores como taxas, pois que estas contribuições não assentam sobre prestações efetivas nem a mera angariação dos rendimentos do trabalho permite inferir com elevado grau de certeza que se venha a dar o seu efetivo aproveitamento, faltando a “relação sinalagmática direta” a que erradamente se referem os artigos 54.º da Lei de Bases e 11.º do Código Contributivo. Mas seria errado, por outro lado, qualificá-las como impostos, pois a angariação dos rendimentos do trabalho e os riscos que lhe são inerentes tornam razoavelmente provável que os trabalhadores e as suas famílias venham a aproveitar algumas das prestações previdenciais que estas figuras visam compensar. Existe, com certeza, um grau de incerteza maior ou menor nesta presunção, podendo ela não se confirmar quanto a este ou àquele contribuinte. Olhando ao grande número, porém, a estatística e a experiência mostram-nos que a maior parte dos contribuintes mais cedo ou mais tarde tende a beneficiar das prestações que a lei associa à doença, maternidade, paternidade, adoção, desemprego, acidentes de trabalho, invalidez, velhice ou morte.» (v. Autor cit., Manual de Direito Fiscal , 2.ª edição, Almedina, Coimbra, 2018, pp. 260-261) De todo o modo, no tocante às contribuições a pagar pelas entidades empregadoras, o mesmo Autor é taxativo quanto ao seu caráter estritamente unilateral: «A presunção de aproveitamento que julgamos válida quanto aos trabalhadores, parece-nos insustentável já quando referida às entidades empregadoras, só remotamente se podendo dizer que estas beneficiam das prestações que se atribuem aos trabalhadores. Assim, não custa admitir que as contribuições a cargo das entidades emprega- doras - que a lei designa de contribuições - representem verdadeiros impostos, por lhes faltar contrapartida efetiva ou presumível. E de admitir que o bem-estar dos trabalhadores e a cobertura dos riscos associados à prestação do

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