TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
633 acórdão n.º 255/20 […] [O] direito à pensão adquire-se, de acordo com o princípio da contributividade (artigo 54.º da Lei de Bases), mediante o cumprimento, por parte do seu titular e de outras entidades, de certas e determinadas obrigações (arti- gos 55.º a 57.º da mesma lei), que sendo devidas ao longo do tempo, são o pressuposto necessário da formação, também ao longo do tempo, do direito a vir a perceber, terminada a vida ativa, a “prestação pecuniária substitutiva do rendimento do trabalho”. Tal é o resultado de uma outra opção do legislador, expressa num outro princípio estruturante do sistema, desta vez relativo ao seu próprio modo de financiamento: na verdade, e de acordo com o disposto no artigo 90.º da Lei de Bases, as prestações substitutivas dos rendimentos do trabalho devem ser finan- ciadas por quotizações dos trabalhadores e por contribuições das entidades empregadoras. Finalmente, cumpridos estes requisitos, – que são portanto o pressuposto causal do direito a perceber a prestação correspondente à pensão, a partir do certo período de tempo que é definido em outros lugares do sistema - o montante da prestação a que se tem direito corresponde a um quantum que, além de ser definido (princípio do benefício definido), é determinado em função das quotizações feitas e das contribuições realizadas (artigos 57.º e 62.º). […] 20. [Assim,] a redução, a título definitivo, de pensões já em pagamento, surge, no contexto do “sistema” que acabámos de descrever, e que foi modelado pela lei em cumprimento de uma injunção constitucional, como uma limitação de dois princípios estruturantes desse mesmo sistema, a saber, o da contributividade e o do benefício definido. Na verdade, uma vez redefinido in pejus , pelo legislador, o montante de uma pensão de que já se beneficia, não só deixa de ser garantida a tendencial correspondência entre esse montante e a “carreira contributiva” que foi o pressuposto causal da aquisição do direito à pensão (princípio contributivo), como sobretudo, é posto em causa o princípio segundo o qual esse montante seria certo (princípio do benefício definido). Tal não é contudo suficiente para que se considere constitucionalmente proibida a medida legislativa de redu- ção definitiva de pensões. Só seria assim se se admitisse uma proibição geral de retrocesso social, em matéria de direitos sociais, no sen- tido de que nunca poderia ser criado um novo regime legal que pudesse afetar qualquer situação jurídica que se encontrasse abrangida pela lei anterior.» No sentido da atenuação do mencionado sinalagma – e, nessa medida, do próprio princípio da contributivi- dade – podem referir-se não apenas o estabelecimento de um limite superior para certas pensões, como a intro- dução de fatores no respetivo cálculo – como o fator de sustentabilidade –que consideram outros aspetos que não o somatório das contribuições sociais pagas ao longo da vida ativa (cfr., respetivamente, os artigos 101.º, n.º 1, e 35.º, ambos do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 1º de maio – define e regulamenta o regime jurídico de proteção nas eventualidades invalidez e velhice do RGSS –; cfr. igualmente os artigos 32.º a 34.º do mesmo diploma). Acresce que a obrigação de contribuir não impende apenas sobre os beneficiários, estendendo-se também às suas entidades empregadoras (cfr. o artigo 57.º, n.º 1, da LBSS). Deste modo, a «referência legal a uma relação sinalagmática direta entre a obrigação legal de contribuir e o direito às prestações parece pressupor um princípio contratualista de correspetividade entre os direitos e obrigações que integram a relação jurídica de segurança social. Mas diversos outros indicadores apontam no sentido de que o legislador pretendeu apenas referir-se à necessária interdependên- cia entre o direito às prestações e a obrigação de contribuir, o que não significa que exista uma direta correlação entre a contribuição paga e o valor da pensão a atribuir […]» (assim, o Acórdão n.º 404/16). Recorde-se, por outro lado, que, sem prejuízo do princípio da adequação seletiva das fontes de financiamento e do princípio contributivo, as quotizações dos trabalhadores e as contribuições dos empregadores, no âmbito de tal sistema, financiam não só as prestações substitutivas dos rendimentos de atividade profissional, como também as políticas ativas de emprego e formação profissional (artigo 90.º, n.º 2, da LBSS); e, em sentido inverso, que «pode haver lugar a transferências do orçamento do Estado e, bem assim, a transferências do Fundo de Estabiliza- ção Financeira da Segurança Social quando a situação financeira do sistema previdencial o justifique» (artigo 14.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 367/2007, de 2 de novembro).
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