TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

624 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL outras sucede o legislador ou a administração lançarem sobre os contribuintes encargos com eficácia retroativa (…). Assim, se estes são tributos que escapam ao artigo 103.º, n.º 3, julgamos, ainda assim, que dos princípios da segurança jurídica e do Estado de Direito fundados no artigo 2.º da Constituição resulta a exclusão da sua aplicação retroativa na generalidade dos casos (…)”.   […] E nos Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 399/17 e 135/12, ficou dito que “(…) a aplicação retroativa das normas que dispõem sobre o regime jurídico das taxas e das contribuições financeiras, apesar de se não encontrar sujeita à proibição estabelecida n.º 3 do artigo 103.º da Constituição, apenas será constitucionalmente conforme se for compatível com os princípios estruturantes que fundamentam aquela proibição, em particular com os prin- cípios da segurança jurídica e da tutela da confiança, ambos decorrentes do artigo 2.º da Constituição. (…) o qual, contrariamente ao primeiro, constitui uma refração não prospetiva mas retrospetiva do valor da segurança jurídica inerente à ideia de Estado de direito democrático (cf. Acórdão n.º 195/17)”. Assim, adotando-se os ensinamentos acima transcritos, a proibição da retroatividade da lei fiscal aplica-se às contribuições financeiras a favor da CGA em causa nos autos, por força dos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança ínsitos no art.º 2.º da CRP» (fls. 65)  De resto, a mesma abordagem é adotada pelo Ministério Público, ora recorrente (cfr. as conclusões 1 e 2 da sua alegação), que, no entanto, chega a conclusão oposta à do tribunal a quo (vide ibidem , a conclusão 10). 6. Em face do exposto, e considerando a jurisprudência dos Acórdãos deste Tribunal n. os 135/12 e 399/17 (a que se podem acrescentar os Acórdãos n. os 695/17 e 770/17) no sentido de o disposto no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição ser aplicável apenas a impostos – mas a todos os impostos, fiscais e extrafis- cais (salientando este aspeto, vide Cardoso da Costa, “O princípio constitucional da não retroatividade dos impostos e a jurisprudência constitucional” in Estudos em Homenagem ao Conselheiro Presidente Joaquim de Sousa Ribeiro , vol I, Almedina, Coimbra, 2019, pp. 121 e seguintes, p. 138, nota 13) –, cumpre começar por examinar a natureza jurídica das contribuições para a CGA aqui em causa, designadamente quanto à sua qualificação como contribuições financeiras. A confirmar-se tal caracterização, importará, de seguida, ajuizar da eventual violação do princípio da confiança, seguindo criticamente o percurso argumentativo da decisão recorrida e da alegação do recorrente. Se, ao invés, se concluir pela natureza fiscal das mesmas contribuições, haverá, então, que indagar do grau de retroatividade inerente à norma sindicada, em ordem a determinar se a mesma infringe a proibição estatuída no artigo 103.º, n.º 3, da Constituição. Preliminarmente, todavia, importará começar por analisar os termos em que o pagamento da mencio- nada contribuição é exigível a entidades como a ora recorrida. Com efeito, este Tribunal tem salientado que a caracterização jurídica de um tributo, nomeadamente para efeito dos parâmetros constitucionais aplicáveis, há de resultar do regime jurídico concreto que se encontre legalmente definido, sendo irrelevante o nomen iuris atribuído pelo legislador ou a qualificação expressa do tributo como constituindo a contrapartida de uma prestação utilizada pelo sujeito passivo, já que, se assim não fosse, bem poderia acontecer que o legisla- dor impusesse um “imposto oculto”, cuja criação se furtaria às exigências constitucionais (cfr., por exemplo, os Acórdãos n. os 365/08, 539/15, 848/17 e 344/19). 7. Conforme referido (vide supra o n.º 4.1), as contribuições dos estabelecimentos de ensino particular ou cooperativo não superior previstas no artigo 6.º-A do EA enquadram-se no RPSC e respeitam apenas às eventualidades diferidas. O regime em causa corresponde a uma modalidade de sistema previdencial, razão por que lhe são aplicáveis os princípios e restantes disposições constantes da LBSS (cfr. o artigo 17.º da Lei n.º 4/2009, de 29 de janeiro; vide também os respetivos artigos 2.º e 28.º).

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