TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
605 acórdão n.º 234/20 exposta ao risco de a qualquer momento (pois tem uma espada de Dâmocles suspensa em permanência sob a sua cabeça) ter de cumprir, tal pena de prisão, caso tenha o “azar” de, eventualmente, ser, entretanto, condenada pela prática de um crime durante o período da suspensão de tal pena de prisão, mesmo que seja numa pena de menor gravidade e devido a uma situação fortuita em que se possa ver envolvida. 21. Assim sendo, e salvo o devido respeito, por opinião contrária, que é muito, nada disto faz qualquer sentido, atentas as linhas basilares do nosso ordenamento Jurídico-penal e constitucional, o qual garante em pleno o direito de todo e qualquer arguido poder exercer o seu direito ao contraditório e à apreciação, quer em sede processual, quer em sede de recurso, os fundamentos que conduziram à sua condenação, bem como as razões de facto e de direito que presidiram à graduação e escolha da pena de prisão em que foi condenado. 22. O direito ao contraditório assume relevância jusconstitucional através dos princípios do estado de direito e da tutela jurisdicional efetiva que implicam a proibição da “indefesa”, assentando o seu núcleo essencial na Inad- missibilidade de prolação de qualquer decisão – mesmo interlocutória – sem que seja previamente conferido ao sujeito processual contra quem é dirigida a efetiva possibilidade de a discutir e contestar – cfr. artigos 2.º e 20.º, ambos da CRP (Cfr. Sérvulo Correia e Jorge Bacelar Gouveia ROA , ano 57 (1997), Tomo I, pg. 326; Gomes Cano- tilho e Vital Moreira, Fundamentos da Constituição ; Carlos Lopes do Rego, “Acesso ao Direito e aos Tribunais”, in Estudos Sobre a Jurisprudência do Tribunal Constitucional , Lisboa, 1993, pg. 57; Parecer da Comissão Constitu- cional n.º 18/81 ( Pareceres da Comissão Constitucional, vol. 17.º, pgs. 14 e ss.); e Ac. Trib. Const. n.º 434/87, de 4.11.87, BMJ 371-160). 23. Assim, à luz do disposto nos artigos 20.º, 29.º, n.º 1, 32.º, n.º 1, todos da Constituição da República Portuguesa e artigo 400.º, n.º 1, al. e) , do Código de Processo Penal, cumpria ao Tribunal a quo admitir e aceitar o recurso interposto pela arguida/recorrente, dando-lhe, assim, a oportunidade constitucional e legal de se defender da pena de prisão em que foi condenada, como é de direito. 24. Ao não fazê-lo, ou seja, ao rejeitar o recurso apresentado pela arguida/recorrente, o Supremo Tribunal de Justiça coartou e violou os princípios constitucionais da legalidade, da certeza, da segurança jurídica, da confiança, da boa-fé, da proporcionalidade, do contraditório, do direito de acesso à Justiça e a um processo equitativo plasmados nos artigos 1.º, 2.º e 20.º, n.º 1 e n.º 4, 29.º, n.º 1, e 32.º, n.º 1, todos da Constituição da República Portuguesa. […]”. 1.3.4. O Ministério Público apresentou contra-alegações, concluindo pela não inconstitucionalidade da norma objeto do recurso, remetendo, inter alia , para os fundamentos dos Acórdãos n. os 429/16, 672/17 e 128/18. Relatado o desenvolvimento do processo nas instâncias, cumpre apreciar e decidir a questão de consti- tucionalidade apresentada ao Tribunal Constitucional. II – Fundamentação 2. Questiona-se, nos presentes autos, a inconstitucionalidade da norma que estabelece a irrecorribili- dade do acórdão da Relação que, inovatoriamente face à absolvição ocorrida em 1.ª instância, condena o arguido em pena de prisão não superior a cinco anos, suspensa na sua execução, norma esta funcionalmente decorrente do artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do CPP, na redação da Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto (cfr. item 1.3.2., supra ). 2.1. A jurisprudência constitucional já se debruçou, por diversas vezes, sobre a inconstitucionalidade da norma contida no artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do CPP, na redação introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro, em diversas interpretações. Recentemente, pelo Acórdão n.º 595/18, do Plenário (na sequência do Acórdão n.º 429/16, que con- firmou o Acórdão n.º 412/15), o Tribunal declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da
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