TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

570 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL AA. O art.º 32.º n.º 7 da Constituição da República Portuguesa visou dar dignidade constitucional ao direito do ofendido a intervir no processo penal, direito este que tem a natureza de Direito Fundamental e mais concre- tamente de Direito, Liberdade e Garantia. BB. Neste sentido, a União Europeia emanou a Diretiva n.º 2012/29/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2012, que estabelece normas mínimas relativas aos direitos, ao apoio e à proteção das vítimas da criminalidade, consagrando no seu Considerando n.º 9 que: “A criminalidade representa um dano para a sociedade, bem como uma violação dos direitos individuais das vítimas.... [que] devem ser protegidas … e beneficiar de apoio adequado para facilitar a sua recuperação e de acesso suficiente à justiça”. CC. Nos termos do disposto no art.º 8.º n.º 4 da Constituição da República Portuguesa, as normas de Direito da União Europeia são aplicáveis na ordem jurídica interna e nos termos definidos no Direito da União, ou seja, tendo em conta os Princípios Fundamentais da União Europeia, nos quais se inserem, desde logo, o Princípio do Primado do Direito da União Europeia e o Princípio da Interpretação Conforme ao Direito da União. DD. E é precisamente a tutela da vítima e do ofendido que urgem fazer com que, ainda que o processo penal não deva (de facto) transformar-se num processo de partes, exista uma maior transparência na administração da justiça e uma maior eficácia no combate à criminalidade (…). EE. O que apenas se conseguirá permitindo ao ofendido e à vítima a participação no processo penal, através da figura do Assistente (art. 68.º do Código de Processo Penal), posto que o processo penal enquanto “direito constitu- cional aplicado” não pode demitir-se dos que em si acreditam ter um garante da justiça penal e da paz jurídica! FF. Aqui chegados, importa frisar que o Direito ao Recurso é um Direito, Liberdade e Garantia ínsito nas Garan- tias Constitucionais de Processo Criminal, garantias que abrangem todos os sujeitos processuais (art.º 32.º n.º 7 da Constituição da república Portuguesa). GG. Princípios aos quais a Constituição da República Portuguesa dá guarida ao considerar que as normas de Direi- to da União Europeia se aplicam no nosso ordenamento jurídico nos termos do próprio Direito da União. O Direito ao Recurso ao abrigo da Lei HH. É um dos elementares fundamentos do Estado de Direito que os Assistentes tenham também têm o direito a suscitar pela primeira vez através de recurso contra uma decisão absolutória que revogou uma decisão anterior condenatória, direito esse constitui uma das mais importantes dimensões das garantias dos Assistentes e do Estado de Direito (sobretudo num tema tão sensível como a violência sobre crianças). II. Como sabemos, é ao legislador ordinário que cabe a tarefa de concretizar os Direitos Fundamentais consagra- dos na Constituição da República Portuguesa. JJ. O que está em causa é o direito ao recurso, ao abrigo dos art. os 399.º, 69.º, n. os 1 e 2, al. c) , 401.º, n.º 1, al. b) , 410.º, n. os 1, 2, al. a) , b) e c) e 3, 432.º, n.º 1, al. b) e d) , 433.º, 434.º, todos do Código de Processo Penal. Do Direito ao Recurso e Inconstitucionalidades KK. O Direito ao Recurso está consagrado no Código de Processo Penal nos artigos 399.º, 69.º, n. os 1 e 2, al. c) , 401.º, n.º 1, al. b) , 406.º, 407.º, 408.º, 410.º, n. os 1, 2, al. a) , b) e c) e 3, 411.º e seguintes, 432.º, n.º 1, al. b) e d) , 433.º, 434.º. LL. No entendimento dos Assistentes o seu Direito ao Recurso ainda não ocorreu, pois, tendo a sentença cons- tituído uma decisão condenatória apenas agora o direito ao recurso surge dado o acórdão ter proferido uma decisão absolutória da Arguida. MM. Tanto no recurso como na reclamação os Recorrentes suscitaram a inconstitucionalidade dos artigos 432.º, n.º 1, al. b) e 400.º, n.º 1, al. d) , do Código Processo Penal, NN. Pugnando pela inconstitucionalidade da sua aplicação, por violação da recorribilidade e dos artigos 9.º, 13.º, n.º 1, 16.º, 18.º, 25.º, 32.º, n. os 1 e 7 e 20.º, n.º 1, da Constituição da República OO. Não olvidamos, nem poderíamos, que o Princípio Constitucional da Igualdade, um dos princípios funda- mentais estruturantes do Estado de Direito Português, não significa uma exigência de igualdade absoluta em

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