TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
561 acórdão n.º 231/20 referente à qualidade de serviço de empresas do setor energético (gás e eletricidade) que a sentença recorrida entendeu sofrer de insuficiente determinabilidade centra-se, pois, na exigência de “um atendimento telefó- nico eficaz”. Foi este enunciado textual identificado pela sentença recorrida para justificar a decisão sobre a questão de inconstitucionalidade. Não merecerá grande dúvida que uma tal expressão (“atendimento telefónico eficaz”) se caracteriza por alguma indeterminação, desde logo por nela não se explicitar quais os instrumentos para aferir o grau de “eficá- cia” do “atendimento” ou os limites mínimos de cumprimento deste dever. Porém, não só o recurso a fórmulas de maior indeterminação ou flexibilidade normativa não implica, só por si, a violação do princípio da tipicidade penal, como, nos termos já expostos, as exigências de tipicidade se fazem sentir em menor grau no âmbito de outros ramos do direito público sancionatório, maxime , no domínio do Direito Contraordenacional. Devemos, pois, aferir se o grau de determinação da norma sancionatória cumpre as exigências constitu- cionais de determinabilidade do ilícito contraordenacional. Neste contexto, terá de se verificar se a norma de conduta que este tutela é objetivamente inteligível para os seus destinatários típicos. O objetivo da exigência de clareza da norma será permitir que os seus destinatários pautem o seu comportamento de harmonia com os deveres impostos naquelas prescrições normativas, podendo identificar as condutas proibidas e antecipar, com segurança, as sanções aplicáveis aos correspondentes comportamentos ilícitos. A questão que se coloca consiste, então, em saber se os destinatários das normas conseguem determinar o que seja “atendimento telefónico eficaz” em ordem a poder assegurar a obrigação que lhes é imposta. 13. Apesar de fazerem apelo a uma cláusula geral – um dever genérico de eficácia no atendimento tele- fónico – as previsões normativas em análise revestem-se ainda de algum grau de precisão na medida em que integram noções correntes da vida aferidas pelos padrões em vigor. Desde logo, no seu sentido semântico a expressão “atendimento telefónico eficaz” não deixa de traduzir uma ideia simples: quem está obrigado a disponibilizar um tal serviço deverá assegurar o atendimento do telefone e quem a ele recorre deverá ver o telefone atendido, tendo em vista, naturalmente, tutelar o interesse do consumidor na resposta à questão que motivou o estabelecimento do contacto telefónico. De todo o modo, nos diplomas considerados, o conceito indeterminado não surge isolado, como sendo a única fórmula legislativa pela qual é tipificado o comportamento contraordenacional, antes deve ser enten- dido no contexto normativo em que se localiza. Assim, no regime regulamentar do “atendimento telefónico eficaz” constante do RQS-SE, estabelecem-se as regras do sistema de atendimento telefónico, designada- mente no conteúdo dispositivo dos artigos 34.º a 37.º Nestes preceitos são discriminadas as funções do sis- tema de atendimento telefónico a instituir, indicando-se claramente que o mesmo se destina à comunicação de leituras, comunicação de avarias e atendimento comercial, diferenciando-se o regime das empresas do setor elétrico em função do número de clientes e volume de tráfego anual de chamadas telefónicas recebidas e indicando-se os critérios financeiros para seu suporte. Assim, por exemplo, deverá ter custo zero o fun- cionamento para o cliente do atendimento telefónico para comunicação de leituras. Finalmente, existem ainda normas inscritas no regulamento que indicam os critérios de desempenho e sua avaliação, impondo, por exemplo, o estabelecimento de um indicador geral relativo ao sucesso da comunicação de leituras que é calculado através do quociente entre o número de leituras registadas de forma automática e o número total de chamadas recebidas para comunicação de leituras. Conjugando estas normas com aquelas que impõem o serviço telefónico eficaz, não será difícil con- cluir que, para poder ser considerado eficaz, o sistema de atendimento telefónico implantado por qualquer prestador de serviço de eletricidade deverá corresponder às exigências funcionais, quantitativas e qualitativas elencadas naquele regulamento. O mesmo vale para o atendimento telefónico por parte dos prestadores de serviço de gás natural. Tam- bém neste caso se estabelecem regras aplicáveis ao sistema de atendimento telefónico ao longo do RQS-SGN. Assim, o regime regulamentar que enquadra a exigência de “atendimento telefónico eficaz” resulta não só dos seus artigos 22.º, n.º 1, 23.º, n.º 3, alínea b) , e 25.º, n.º 1, devendo estes preceitos ser lidos conjugadamente
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