TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

557 acórdão n.º 231/20 direito democrático, da segurança jurídica e da confiança, pelo que são materialmente inconstitucionais, por violação do artigo 2.º da Constituição» (fls. 1495). A decisão recorrida questiona a conformidade da norma com o princípio da segurança jurídica, enquanto elemento integrante do Estado de direito, mais concretamente na dimensão de imposição ao legislador de acautelar a «suficiente determinabilidade» das previsões normativas, designadamente de preceitos que esta- belecem contraordenações. De acordo com a sentença recorrida, «em concreto, o que se imputa à recorrente é a ausência de um sistema de atendimento telefónico eficaz» (fls. 1488). 9. Importa, assim, apreciar se a imposição aos operadores do mercado de gás natural e eletricidade dos deve- res de conduta (organização de um “atendimento telefónico eficaz” aos clientes) descritos nas expressões norma- tivas dos artigos 23.º, n.º 3, alínea b) , e 25.º, n.º 1, do RQS-SGN, por uma parte, e artigos 31.º, n.ºs 1 e 2, alínea d) , do RQS-SE, por outra parte, cuja violação é cominada com uma contraordenação leve, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, 28.º, n.º 3, alínea j) , e 29.º, n.º 3, alínea j) , do RSSE, cumpre o requisito de “suficiente determinabili- dade” para efeitos da garantia constitucional da segurança jurídica, decorrente do princípio do Estado de direito ínsito no artigo 2.º da Constituição. Importa aferir essa “determinabilidade” da obrigação imposta do ponto de vista dos seus destinatários típicos, verificando se esta lhes permite evitar incorrer nas condutas proibidas. Refira-se que a apreciação do Tribunal Constitucional do presente recurso vai incidir apenas sobre a questão de constitucionalidade perante si colocada (artigo 280.º, n.º 6, da Constituição). Naturalmente não cabe no âmbito da jurisdição do Tribunal Constitucional pronunciar-se sobre o caso concreto – quais os factos dados como provados ou a correção da operação de subsunção do direito a estes, nomeadamente sobre se o tipo contraordenacional se encontra preenchido, tudo isto são matérias que escapam ao controlo do Tribunal Constitucional. ii) Análise da questão de constitucionalidade 10. O Tribunal Constitucional tem abundante jurisprudência versando sobre a extensão dos princípios da legalidade e da tipicidade ao domínio contraordenacional. A este propósito merece destaque o que a propósito se pode ler no Acórdão n.º 297/16, do Plenário, citando o Acórdão n.º 201/14, da 1.ª Secção: «14. Sobre a distinção entre os domínios sancionatórios penal e contraordenacional já se pronunciou este Tribunal, em extensa, pese embora fragmentária, jurisprudência em que se colocou o problema da valência de determinados princípios constitucionais com relevo em matéria penal no domínio contraordenacional. A tanto se refere a pormenorizada análise efetuada no Acórdão n.º 201/14, em especial nos excertos que se transcrevem de seguida, referidos aos princípios da legalidade e da tipicidade e da culpa e às garantias de defesa do arguido, de que nos prevalecemos: “(…) Princípios da legalidade e da tipicidade 9.1. É rica a jurisprudência deste Tribunal sobre a extensão dos princípios da legalidade e da tipicidade ao domínio contraordenacional. (…) Em síntese, retira-se da jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre a extensão dos princípios da legalidade e da tipicidade ao domínio contraordenacional que (i) embora tais princípios não valham “com o mesmo rigor” ou “com o mesmo grau de exigência” para o ilícito de mera ordenação social, eles valem “na sua ideia essencial”; (ii) aquilo em que consiste a sua ideia essencial outra coisa não é do que a garantia de proteção da confiança e da segurança jurídica que se extrai, desde logo, do princípio do Estado de direito; (iii) assim, a Constituição impõe “exigências mínimas de determinabilidade no ilícito contraordenacional” que só

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