TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

552 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL d) A grande inovação introduzida pelo RQS-SE-GN/2017 foi a fixação de um padrão para a aferição do cumpri- mento do indicador do tempo de espera no atendimento telefónico comercial o qual foi fixado em 85%, sendo que a introdução deste padrão permite agora avaliar objetiva e quantitativamente se o atendimento telefónico de um comercializador é ou não eficaz; e) A nova regulamentação passou, pois, a dispor que o cumprimento da obrigação de dispor de um serviço de atendimento telefónico eficaz é aferido através do cumprimento do padrão mínimo (85%) do indicador rela- tivo ao tempo de espera do atendimento, medido entre o número de chamadas com tempo de espera inferior ou igual a 60 segundos e o número total de chamadas; f ) Tal significa que a nova solução regulamentar introduzida pelo RSQ-SE-GN/2017 é objetivamente mais favo- rável do que os anteriores quadros regulamentares ao abrigo dos quais a Recorrida foi condenada pelo que deve prevalecer aqui o princípio da aplicação da lei sancionatória mais favorável, plasmada no n.º 2 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro; g) Consequentemente, não podendo a decisão administrativa ser mantida na ordem jurídica, torna-se superve- nientemente inútil a discussão e a decisão sobre a inconstitucionalidade das normas regulamentares em que a mesma se ancorou; h) Deve assim este Tribunal julgar extinta a presente instância por inutilidade superveniente da lide, ou, caso se entenda que o mesmo não tem competência para decidir incidentalmente, no caso concreto, a questão da aplicação da lei sancionatória mais favorável, deverá previamente suspender a instância e ordenar a baixa dos autos ao tribunal a quo para apreciação e decisão dessa questão; i) Em qualquer caso, sempre o presente recurso de constitucionalidade deverá ser julgado improcedente, confir- mando-se o juízo de inconstitucionalidade emanado pelo tribunal a quo; j) Conforme se alcança com meridiana clareza, não é possível, com rigor e objetividade, determinar a priori em que consiste um “sistema de atendimento telefónico eficaz” – o que é violador do princípio da tipicidade em matéria de ilícitos de mera ordenação social e, por decorrência, violador das exigências dos princípios do Estado de direito democrático, da segurança jurídica e da confiança, previstos no artigo 2.º da Constituição; k) Desde logo, não pode considerar-se que um “sistema de atendimento telefónico eficaz” é aquele em que um cliente liga e, após escolha do assunto a tratar, é imediatamente atendido por um operador; l) o n.º 2 do artigo 25.º do próprio RQS-GN admitia que podia não ser possível efetuar desde logo o atendi- mento ao cliente – o que demonstra, precisamente, que um sistema de atendimento telefónico pode ser “eficaz” pese embora a ocorrência de situações em que os clientes não são imediatamente atendidos; m) A questão relevante para se saber se um sistema de atendimento telefónico é ou não “eficaz” não estará tanto no facto de haver situações em que os clientes não são imediatamente atendidos mas, quanto muito, no universo e frequência em que tais situações ocorrem; n) Ora, tal perspetiva, que é necessariamente quantitativa, afasta desde logo a possibilidade de emprestar um sentido útil e autónomo ao conceito de “sistema de atendimento telefónico eficaz”; o) Com efeito, inexistindo metas quantitativas para o atendimento telefónico imediato dos clientes e perante a existência do dever de ter um “sistema de atendimento telefónico eficaz”, de que forma devem agir os respetivos destinatários das normas em ordem ao seu cumprimento? p) Por outras palavras, quando a própria ERSE estabelece nos seus regulamentos o dever de os comercializadores disporem de um “sistema de atendimento telefónico eficaz” que situações é que quis exatamente e em concreto abranger com tal conceito? q) O próprio recorrente do presente recurso de constitucionalidade, pese embora o esforço da tarefa, emmomento algum logrou esclarecer em que consiste um “atendimento telefónico eficaz”, tendo-se refugiado num outro conceito indeterminado – o “estar à altura” – para tentar demonstrar a suposta determinabilidade do conceito; r) Acresce que o presente processo e a decisão administrativa nele proferida comprova que só o casuísmo e a completa subjetividade podem imperar para efeitos de interpretação e aplicação do conceito de “atendimento telefónico eficaz”, porquanto os factos subsumidos nesse conceito se limitaram à “quantidade” de queixas e reclamações apresentadas e, bem assim – pasme-se – no teor de algumas reclamações dos clientes, nos casos em

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