TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

537 acórdão n.º 230/20 Assim sendo, a autorização há de conter os princípios, as normas fundamentais que concedem unidade lógico- -política à disciplina a editar pelo Governo, e há de estabelecer também as diretivas, reconduzíveis à determinação das finalidades a que aquela disciplina tem de adequar-se. E deve sublinhar-se com especial destaque, que se o sentido da autorização não tem de exprimir-se em abundantes princípios ou critérios diretivos (que levados às últimas consequências poderiam até condicionar por inteiro em termos de conteúdo o exercício dos poderes delegados), deverá, no mínimo, como condição da sua própria verificação, ser sufi- cientemente inteligível a fim de poder operar como parâmetro de aferição dos atos delegados e, consequentemente, como padrão de medida por parte do legislador delegado do essencial dos ditames do legislador delegante (cfr. por todos, os Acórdãos n. os 107/88 e 70/92, Diário da República , respetivamente, I Série, de 21 de junho de 1988 e II Série, de 18 de agosto de 1992). […]” (itálicos acrescentados). E, ainda, no Acórdão n.º 358/92 (vide, também, o Acórdão n.º 491/08): “[…] Após 1982, o modelo constitucional português aproxima-se do vigente na Lei Fundamental de Bonn onde, no seu artigo 80.º, se exige que a lei de autorização “contenha, em termos determinados, o conteúdo, o objeto e o alcance da autorização outorgada”. A definição destes limites deve constar imediatamente da lei de autorização, não podendo ser determinados apenas a partir dos próprios diplomas autorizados, na medida em que é o próprio legislador delegante que tem a obrigação constitucional de estatuir as normas habilitantes, e deve fazê-lo em termos que, simultaneamente, orientem o legislador delegado e tornem reconhecível e até previsível pelo cidadão qual o sentido da legislação que vai ser emanada ao abrigo dos poderes delegados. Como referem Maunz, Durig e Herzog ( Grundgesetz-Kommentar, Munchen, 1978, comentário ao art.º 80.º, nota 30) ‘o legislador tem que tomar decisões, segundo uma orientação que repute conveniente, relativa a domínios vitais do ordenamento, tem que ter querido alguma coisa e pensado no que queria, sem poder transferir o essencial dessa decisão para a entidade que emite o decreto.’ Analisando esta questão, António Vitorino (As autorizações legislativas... cit., p. 233), refere que ‘na doutrina alemã a conjugação dos três elementos referenciados, constantes da lei de autorização, prefiguram o ‘programa normativo’ da delegação, suscetível de uma interpretação uniforme que possibilita que, a partir de uma das suas vertentes, o intérprete (ou o julgador) determine os elementos essenciais dos outros dois pressupostos ou limites da delegação. Essa faculdade, que relativiza a exigência de, logo na lei, se conter em detalhe todos os limites que presidem à delegação, constitui uma resultante do próprio posicionamento do Tribunal Constitucional Federal, cuja jurisprudência tem vindo progressivamente a afrouxar o grau de exigência desses elementos, em termos tais que tem tido por verificada a existência de cada elemento ou limite da autorização à luz e no contexto do restante conteúdo dessa autorização. Em contrapartida, a mesma doutrina alemã tem detetado que, no domínio do Direito Penal e do Direito Fiscal, a jurisprudência do Tribunal Constitucional Federal tem vindo a impor exigências mais rígidas quanto às leis de autorização, atento o melindre de que revestem tais leis nesses domínios, face à defesa dos direitos e interesses dos cidadãos. Diversa é a situação nos ordenamentos jurídicos italiano e espanhol onde, nos artigos 76.º e 82.º, respetiva- mente, da Constituição da República italiana e da Constituição espanhola, o grau de exigência de especificação dos limites materiais da lei de delegação é bastante maior do que no caso alemão, dela devendo constar expressamente os ‘princípios e critérios diretivos’ orientadores do exercício dos poderes delegados, sendo, aliás, assinalável a polé- mica doutrinária acerca da profundidade com que a lei de autorização pode condicionar o exercício dos poderes autorizados. O texto constitucional português, como já se deixou dito, aproxima-se mais do seu congénere alemão, podendo enten- der-se que o sentido de uma autorização legislativa, sendo um dos elementos do ‘conteúdo mínimo exigível’ da lei de autorização, só é efetivamente observado quando as indicações a esse título constantes da lei de autorização permitam

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