TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

527 acórdão n.º 230/20 A versão aprovada acabou por ser, todavia, “[…] regime geral de punição das infrações disciplinares, bem como dos atos ilícitos de mera ordenação social e do respetivo processo ” [ Diário da Assembleia da República , I Série, n.º 120, de 16 de julho de 1982, p. 5040; Diário da Assembleia da República , II Série, Suplemento ao n.º 73, de 31 de março de 1982, p. 1352-(21)], daí resultando que “o regime geral do processo disciplinar não se inclui na alínea d) , em referência” [ O direito disciplinar da função pública (dissertação de doutoramento em ciências jurídico-políticas) , vol. II, Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 2007, texto disponível em http://hdl.handle.net/10451/164 , p. 134, destaque acrescentado]. Ou seja, “[…] a 1.ª revisão da Lei Fun- damental veio, porém, introduzir no n.º 1 do artigo 168.º uma nova alínea – a alínea d) –, por virtude da qual passou a constituir reserva relativa de competência legislativa o regime geral de punição dos atos ilícitos de mera ordenação social e do respetivo processo , e igualmente o regime geral de punição das infrações disciplinares ” (Acórdão n.º 155/91, itálico acrescentado). No mesmo sentido, pode ler-se, no Acórdão n.º 635/15, o seguinte: “[…] Em primeiro lugar, aos olhos da Constituição, não é confundível o domínio dos ilícitos e sanções criminais com outros tipos de ilícito, designadamente o disciplinar. A Lei Fundamental distingue-os, desde logo, ao nível do âmbito da competência exclusiva reservada à Assembleia da República. Esta reserva abrange a definição dos crimes, penas e res- petivos pressupostos, bem como o respetivo processo, no primeiro caso [artigo 165.º, n.º 1, alínea c) , da Constituição], limi- tando-se a abranger o regime geral de punição das infrações disciplinares [artigo 165.º, n.º 1, alínea d) , da Constituição]. Esta diferenciação reflete-se também na densidade constitucional dedicada a cada um dos regimes sancionató- rios, sendo que apenas o ilícito criminal e as sanções de natureza criminal se encontram extensamente regulados na Constituição ao condensar, no artigo 29.º, o essencial do regime constitucional da lei criminal. Não se ignora que os princípios ali definidos para o direito criminal propriamente dito (crimes) têm sido estendidos, na parte perti- nente, aos demais domínios sancionatórios, como o do ilícito disciplinar – é o caso do princípio da legalidade, da não retroatividade, da aplicação retroativa da lei mais favorável e da necessidade e proporcionalidade das sanções. Mas esta extensão não nega a diferenciação dos domínios, antes a confirma e, nessa medida, sufraga a ausência de identidade normativa entre medidas penais e medidas disciplinares. […]” (itálicos acrescentados). Entende-se, pois, designadamente à luz da respetiva história legislativa, que a leitura mais correta da alínea d) do n.º 1 do artigo 165.º da CRP exclui do respetivo âmbito as regras gerais do procedimento disciplinar. As afirmações aparentemente divergentes da jurisprudência constitucional – cfr., por exemplo, o Acór- dão n.º 472/97, no qual se afirma que “[…] o regime geral de punição das infrações disciplinares é o que se concretiza na definição da natureza do ilícito, dos tipos de sanções e seus limites, e ainda das correspondentes regras de processo ” (itálico acrescentado) – devem, pois, entender-se como referidas não a toda e qualquer regra de processo, mas sim ao que alguma doutrina designa como “princípios fundamentais do procedi- mento relativos à audiência e defesa do trabalhador arguido” (Ana Fernanda Neves, O direito disciplinar da função pública , vol. II, cit., p. 137). Em suma, a previsão legislativa de um recurso tutelar necessário em matéria disciplinar diz respeito ao respetivo procedimento , que não está abrangido pela reserva de competência legislativa prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 165.º da CRP. Consequentemente, este preceito não é apto para servir de fundamento à invocada inconstitucionalidade. 2.3.2. Ainda que assim não fosse – ou seja, ainda que a vertente meramente adjetiva do procedimento discipli- nar estivesse contida no âmbito na alínea d) do n.º 1 do artigo 165.º da CRP –, importaria ter presente o alcance da reserva, que se limita ao “regime geral” das infrações disciplinares. Como se sublinha no Acórdão n.º 472/97:

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