TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

517 acórdão n.º 230/20 Está em causa uma deficiência estrutural do recurso, porquanto respeita à definição de elementos essenciais: tribunal recorrido, decisão recorrida e norma sindicada. A instância do recurso assim interposto estabeleceu uma relação entre o Supremo Tribunal Administrativo e o Tribunal Constitucional, pelo que a decisão deste último de conceder ou negar provimento ao recurso ou de o rejeitar apenas pode vincular o primeiro e projetar efeitos sobre a respetiva decisão. 8. Tal deficiência não pode ser ultrapassada oficiosamente ( v. g. no exercício de uma cooperação ativa, mediante a ‘correta’ interpretação do ‘objeto material’) nem a requerimento do recorrente ( v. g. por via do deferimento de uma requerida substituição do objeto real do recurso pelo ‘objeto intencionado’). De resto, a mesma deficiência também não poderia ter sido sanada mediante a prolação de um despacho-convite. Com efeito, a função do despacho-convite previsto nos n. os 5, 6 e 7 do artigo 75.º-A da LTC é a de suprir vícios formais do requerimento de recurso ou de permitir o esclarecimento de dúvidas sobre os termos, sentido ou alcance do impulso recursório; não a de ‘salvar’ recursos inviáveis em razão de deficiências processuais de caráter estrutural, seja por ineptidão do respetivo requerimento (cfr., por exemplo, os Acórdãos n. os 252/08, 373/12, 112/13 e 286/16), seja por falta de pressupostos processuais (como, por exemplo, o da utilidade do recurso por não coincidência entre a ratio decidendi da decisão recorrida e a norma sindicada no recurso de constitucionalidade; v. também, entre outros, os Acórdãos n. os 566/12 e 159/15). No caso vertente, o requerimento de recurso respeitou todas as exigências formais estatuídas no artigo 75.º-A, n. os 1 e 2, da LTC: o mesmo requerimento é inequívoco quanto ao seu objeto, pois a recorrente pretendeu recorrer da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Administrativo que aplicou o artigo 150.º, do CPTA (fls. 335). Mais: tal requerimento foi endereçado ao Supremo Tribunal Administrativo (vide ibidem ). – o tribunal que proferiu a decisão recorrida – e foi entregue nesse mesmo Supremo Tribunal (vide ibidem ). Por isso, foi também esse o tri- bunal que exerceu as competências previstas no artigo 76.º, n. os 1 a 3, da LTC (a apreciação e admissão do recurso de constitucionalidade pelo tribunal que tiver tomado a decisão recorrida – fls. 339). De resto, a propósito do exercício de tais competências, o mesmo tribunal não considerou que o requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade estivesse incompleto ou suscitasse qualquer dúvida, e, por isso mesmo, não endereçou à recorrente qualquer despacho-convite nos termos do artigo 75.º-A, n.º 5, da LTC. Nestas circunstâncias, inexiste qualquer deficiência formal ou dúvida carecida de esclarecimento que pudessem justificar a prolação de um despacho-convite. Foi essa a conclusão alcançada tanto no tribunal recorrido, como neste Tribunal. Por outro lado, admitir que no presente caso ocorre um ‘mero lapso’, implicaria reconhecer que o relator no Supremo Tribunal Administrativo incorrera numa admissão do recurso a non domino – a qual, de todo o modo, nunca seria irrelevante em sede de apreciação do cumprimento dos pressupostos do recurso. Como se salientou no Acórdão n.º 628/15, «o endereçamento do requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional a órgão diverso do tribunal que proferiu a decisão recorrida e a admissão do recurso por órgão sem competência para o efeito, constituem obstáculo ao conhecimento do objeto do recurso de constitucionalidade, como tem sido reitera- damente entendido por este Tribunal – cfr., entre muitos outros, os Acórdãos n. os 622/04, 176/05, 345/05 e 618/06». 9. Decisivo, porém, é que, no plano processual, o impulso recursório da recorrente foi dirigido à decisão do Supremo Tribunal Administrativo, impedindo, desse modo, o trânsito em julgado de tal decisão – a não admissão do recurso de revista, que, nos termos da lei processual aplicável, é um recurso ordinário (cfr. o artigo 80.º, n.º 4, da LTC) – e, con- sequentemente, também, o trânsito em julgado da decisão de apelação proferida pelo Tribunal Central Administrativo Sul – que corresponde, afinal, àquela que aplicou as normas cuja constitucionalidade a recorrente pretende questionar junto do Tribunal Constitucional. Ora, esta última decisão só pode ser objeto de recurso de constitucionalidade depois de transitada em julgado. Com efeito, o recurso de constitucionalidade para apreciação das inconstitucionalidades suscitadas pela recor- rente e alegadamente desconsideradas pelo Tribunal Central Administrativo Sul não depende da admissão da revista; depende apenas de a decisão deste Tribunal se tornar definitiva (cfr. artigos 70.º, n.º 2, e 75.º, n.º 2, ambos da LTC). Assim, uma vez assente, em moldes definitivos, a inadmissibilidade da revista interposta, pode a recorrente interpor recurso de constitucionalidade do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul – e relativamente ao qual

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