TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

49 acórdão n.º 30/20 Portuguesa Anotada , Tomo I, 2.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2010, anot. XVIII ao artigo 20.º, p. 441).”» «É assente, na jurisprudência constitucional, que do conteúdo do direito de defesa e do princípio do contra- ditório resulta prima facie que cada uma das partes deve poder exercer uma influência efetiva no desenvolvimento do processo, devendo ter a possibilidade, não só de apresentar as razões de facto e de direito que sustentam a sua posição antes de o tribunal decidir questões que lhes digam respeito, mas também de deduzir as suas razões, oferecer as suas provas, controlar as provas do adversário e tomar posição sobre o resultado de umas e outras (cfr. designadamente, os Acórdãos n. os 1185/96 e 1193/96).» «A jurisprudência adota, assim, um entendimento amplo do contraditório, entendido “como garantia da par- ticipação efetiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objeto da causa e que em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão” (Lebre de Freitas, Introdução ao processo civil: conceito e princípios gerais. Coimbra: Coimbra Editora, 1996, p. 96.). Adianta ainda este autor que “o escopo principal do princípio do contraditório deixou assim de ser a defesa, no sentido negativo de oposição ou resistência à atuação alheia, para passar a ser a influência, no sentido positivo de direito de incidir ativamente no desenvolvimento do processo.”» 6. No caso em apreço está em causa a apreciação e condenação de uma das partes como litigante de má fé. Preliminarmente, importa recordar que «o Tribunal Constitucional não tem enquadrado as [normas que regulam a litigância de má fé], quando aplicadas em processos de natureza civil, no âmbito do artigo 32.º da CRP – que regula as garantias em processo criminal e contraordenacional –, mas sim no âmbito de proteção do artigo 20.º da Lei Fundamental: “acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva” (cfr. Acórdão n.º 302/05)» (assim, vide o Acórdão n.º 652/17, n.º 2.3). Por outro lado, como a recorrente salientou, a jurisprudência deste Tribunal também tem entendido, a propósito da condenação por litigância de má fé em geral – isto é, nos termos do disposto no artigo 456.º, n. os 1 e 2, do Código de Processo Civil de 1961, e a que corresponde o artigo 542.º, n. os 1 e 2, do atual –, que a mesma só deve ter lugar, dando-se à parte (ou, sendo o caso, ao seu representante), antes de assim ser condenada, a oportunidade de se defender, para o que tem que ser, previamente, ouvida. Ou seja: uma tal condenação exige que se observe, no processo, o princípio do contraditório; com efeito, embora não for- mulado na Constituição expressamente para o processo civil, não pode, na verdade, deixar de valer também neste domínio (vide, por exemplo, os Acórdãos n. os 440/94, 103/95 357/98 e 289/02; reiterando tal enten- dimento, no tocante ao Código de Processo Civil de 2013, e com referência ao respetivo artigo 123.º, n.º 3, vide o Acórdão n.º 174/18, n.º 11). 7. A norma questionada no presente recurso é extraída do artigo 123.º, n.º 3, do Código de Processo Civil e apresenta a particularidade de associar normativamente a apreciação da má fé à decisão sobre a impro- cedência da suspeição: «quando julgar improcedente a suspeição, [o presidente] apreciará se o recusante procedeu de má fé». Deste modo, sendo indeferido o incidente de suspeição, está o presidente da relação obrigado a apreciar se o recusante procedeu de má fé. Simplesmente, daqui não se segue que seja de excluir o interesse e a utilidade de audição do mesmo recusante. Com efeito, e de acordo com o sentido e alcance do princípio do contraditório, este deve poder pronunciar-se sobre os aspetos factuais e jurídicos de tal apreciação e, por essa via, concorrer para influenciar o resultado da apreciação e, se for o caso, a subsequente sanção. Inexiste, na verdade, qualquer especificidade no caso da norma ora sindicada que justifique a possibilidade de aplicar uma sanção em consequência de conduta processual tida por censurável sem que antes tenha sido assegurada ao respetivo destinatário a pos- sibilidade de influenciar o sentido de tal decisão, deduzindo as suas razões.

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