TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

484 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 3.ª) Assim, dispunha o Código de Processo Civil então vigente, desde a sua aprovação pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de dezembro (e continua a dispor), no seu artigo 909.º (Caso em que a venda fica sem efeito), n.º 2, que “Quando, posteriormente à venda, for julgada procedente qualquer ação de preferência ou for deferida a remição de bens, o preferente ou o remidor substituir-se-ão ao comprador, pagando o preço e as despesas da com- pra” e no artigo 914.º (Predomínio da remição sobre o direito de preferência), n.º 1, desse mesmo diploma legal, enunciava “O direito de remição prevalece sobre o direito de preferência”. 4.ª) Há ainda que relevar que o artigo 258.º (Remição) do CPPT, dispunha, já então, o seguinte: “O direito de remição é reconhecido nos termos previstos no Código de Processo Civil”. 5.ª) Em suma, este é um regime legal que tutela com especial veemência o direito de remição, o qual pode ser feito valer em juízo, mesmo após a venda executiva, perante o comprador (sem que a venda seja anulada, antes por sub-rogação na posição daquele), e prevalece sobre o comprador e o titular do direito de preferência. 6.ª) Por outra parte, importa não olvidar que o Tribunal Constitucional, através de jurisprudência reiterada e assente, já traçou as diretrizes constitucionalmente idóneas para enquadrar a análise do direito (e princípio jurídico objetivo) fundamental à “tutela jurisdicional efetiva”, sendo em particular de frisar a doutrina veiculada nesta pas- sagem: “os regimes adjetivos devem revelar-se funcionalmente adequados aos fins do processo e conformar-se com o princípio da proporcionalidade, não estando o legislador autorizado a criar obstáculos que dificultem ou prejudi- quem, arbitrariamente ou de forma desproporcionada, o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva” (cfr., por todos, como acórdão de referência, o n.º 350/2012, proc.º n.º 571/2011, de 5 de julho, n.º 3). 7.ª) Ora, por uma parte, a citação ao executado da instauração do processo de execução fiscal, bem como a ulterior notificação ao mesmo, em 18 de setembro 2006, da nomeação do negociador particular dos bens penhorados, por virtude de não terem sido conseguidos proponentes na venda judicial, e ainda os editais e anúncios subsequentes, são idóneos para transmitir a destinatário normal o perfil da situação em causa e, sobretudo, para o pôr de sobreaviso quanto à eminência da transmissão forçada do direito de propriedade sobre a casa de habitação, como realmente veio a ocorrer logo em 10 de janeiro de 2007, ficando assim ciente do risco grave e iminente de perda patrimonial e, con- comitantemente, de que será imperioso e urgente usar os meios legais idóneos para esconjurar tal risco. 8.ª) Por outra parte, a sentença recorrida tem fundamento num raciocínio virtual, consubstanciado na conje- tura segundo a qual a notificação ao executado (do conteúdo da proposta de aquisição do bem penhorado sujeito a venda por negociação particular e do momento em que essa venda vai ocorrer) determinará a efetiva a proteção jurisdicional do direito de remição dos familiares do mesmo, ou seja, não estamos no campo do discurso jurídico e do juízo jurídico, mas antes no campo do discurso político-legislativo e do juízo problemático. 9.ª) Ora, segundo as regras da experiência comum, tal putativa notificação será idónea para reforçar no execu- tado a consciência da gravidade da situação e da eminência da transmissão forçada do direito de propriedade, mas já não é líquido, sempre segundo tais regras da experiência comum, que tenha a virtualidade de concorrer de modo determinante para a efetivação do direito de remição dos familiares do executado. 10.ª) Finalmente, mais não menos importante, em virtude da já mencionada prerrogativa de “liberdade de conformação” do legislador, este não está necessariamente vinculado a certo meio específico de garantia do direito de remição, que aliás não está prescrito na lei constitucional, nomeadamente, não está adstrito à criação de uma obrigação de notificação em processo de execução fiscal pendente, como meio de garantia judicial do direito de remição – mais a mais uma notificação que, na tese da sentença recorrida, teria por destinatário o executado e não o titular (ou titulares) do direito de remição. 11.ª) Assim, na linguagem da Constituição, não se tratará forçosamente de assegurar ao titular (ou titulares) do direito de remição que “intervenham numa causa pendente” (n.º 4), mas de lhes assegurar uma proteção, efetiva, se necessário através do “acesso a um tribunal para defesa do seu direito” (n.º 1), proteção jurisdicional essa que está efetivamente garantida, nomeadamente através do acesso ao tribunal, para fazer prevalecer, de modo absoluto, o direito de remição sobre o direito do comprador e do titular de eventual direito de preferência (CPC, art. 909.º, n.º 2, e CPPT, art. 258.º). 12.ª) Acresce que a norma jurídica, expressa pelos preceitos dos artigos 886.º-A, n. os 1 e 4, e 905.º do CPC, e do artigo 252.º do CPPT, não consubstancia restrição do direito de remição (pressupondo hic et nunc, ao menos

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