TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

482 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL permitir a realização do negócio. Mas a questão a ser aqui apreciada não pode assentar num ponto de partida que radique no direito ou nos direitos do executado per si, mas nos efeitos que se produzirão na esfera dos titulares do direito de remição em virtude dos direitos que não se reconhecem ao executado. A interpretação das normas dos artigos 886.º-A, n. os 1 e 4, artigo 905.º e 229.º do CPC e do artigo 252.º do CPPT no sentido de que a notificação do executado da proposta de aquisição que veio a ser aceite e do dia e hora da marcação da venda judicial não é obrigatória poderá encontrar uma justificação no facto de se presumir que o executado irá acompanhar essas diligências e irá comunicar aquilo de que for tendo conhecimento aos seus fami- liares para que estes possam em tempo exercer o seu direito de remição. Porém, essa restrição ao direito à tutela jurisdicional efetiva, esses obstáculos que são, assim, colocados ao exercício por parte dos familiares do executado do direito de remição de que sejam titulares, já que o exercício atempado deste direito estará dependente de uma série de ações a empreender pelo executado, já não encontra justificação nas complicações que se iriam produzir no processo de execução e que comprometeriam a sua celeridade, pois não há que procurar o executado, uma vez que ele é conhecido no processo. Existe uma justificação para essa restrição, mas a mesma acaba por ser excessiva, pois existe um meio alternativo que não põe em causa a celeridade do processo e que é menos onerosa para os titulares do direito de remição. De facto, a alternativa a «obrigar» o executado a empreender diligências para que possa ter conhecimento do desenrolar do processo e assim poder comunicá-las aos seus familiares seria apenas e só notificar o executado, informando-o do conteúdo da proposta de aquisição do bem penhorado sujeito a venda negociação particular e do momento em que essa venda vai ocorrer. Ou seja, interpretar-se as normas dos artigos 886.º-A, n. os 1 e 4, artigo 905.º e do artigo 252.º do CPPT no sentido de que a notificação ao executado do conteúdo da proposta de aquisição do bem penhorado sujeito a venda por negociação particular e do momento em que essa venda vai ocorrer não é obrigatória restringe de forma excessiva, e nessa medida, desproporcional o direito a uma tutela jurisdicional efetiva dos familiares do executado e titulares do direito de remição, na medida em que a possibilidade de os titulares do direito de remissão exercerem atempadamente o seu direito passa a estar dependente de uma série de ações de concretização incerta ou de uma atividade de controlo de difícil exercício que se revela excessiva face aos custos insignificantes de uma simples noti- ficação ao executado. Entender-se que tal notificação não é obrigatória não confere aos titulares do direito de remi- ção um regime jurídico que lhes proporcione um meio efetivo de defesa desse direito que se encontra consagrado na lei, já que dificulta de forma excessiva, desproporcional o direito a uma tutela jurisdicional efetiva, atentando contra o modelo do processo equitativo (veja-se a declaração de voto do Juiz Conselheiro João Cura Mariano no ac. do TC de 22/6/2016, P. n.º 349/15, na qual se conclui precisamente neste sentido; assim como e sobre as dimen- sões do princípio da proporcionalidade, entre elas a da exigibilidade ou necessidade, Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Almedina, 7.ª edição, pp. 266 e seguintes). Deste modo, considera o Tribunal que as normas dos artigos 886.º-A, n. os 1 e 4, artigo 905.º e do artigo 252.º do CPPT, nas redações aqui aplicáveis, devem ser interpretados com o sentido de que na venda por negociação par- ticular de bem penhorado em processo de execução fiscal é obrigatória a notificação do executado da proposta de aquisição que veio a ser aceite, assim como do dia e hora marcados para a efetivação da venda, não sendo suficiente a notificação que deu conhecimento ao executado da modalidade da venda que iria ser prosseguida, por força do direito à tutela jurisdicional efetiva e a um processo equitativo, consagrados nos artigos 20.º, n. os 1. e 4, da CRP.  […] Como resulta do probatório e não é posto em causa pela AT, o executado e pai da ora Reclamante não foi noti- ficado da proposta de aquisição que foi aceite, nem do dia e hora marcados para a efetivação da venda, tendo ape- nas sido notificado do despacho de adjudicação já depois de lavrada a escritura de compra e venda e depois de ter tido conhecimento da venda e de ter sido interpelado para desocupar o imóvel (cfr. pontos 1 a 17 do probatório). Considerando o Tribunal que a lei interpretada em conformidade com a CRP impõe tais notificações, o despacho objeto da presente reclamação padece de um erro nos seus pressupostos de direito. Um erro que, no caso, tem a virtualidade de anular a venda do imóvel em causa, pois se as normas acima referidas devem ser interpretadas como acima exposto, então significa que a lei impõe que o executado deve ser notificado da proposta de aquisição que foi aceite, assim como do dia e hora marcados para a efetivação da venda,

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