TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

48 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL VI – No âmbito do regime da litigância de má fé, vem o Tribunal Constitucional reiteradamente afirmando que, por força dos direitos de defesa e de contraditório contidos no direito a um processo equitativo consagrado no artigo 20.º n.º 4 da Constituição da República Portuguesa, a decisão que aplica a multa processual prevista no regime da litigância de má fé pressupõe a prévia audição do interessado, ao qual deve ser reconhecida a facul- dade de alegar o que tiver por conveniente quanto à condenação em multa conforme acórdãos do Tribunal Constitucional números 440/94, 103/95, 357/98 e 289/02. VII – Face ao supra exposto, e por se entender que a interpretação do Venerando Tribunal da Relação de Évora é inconstitucional, requer-se que seja dado provimento ao presente recurso, e em consequência ser declarada a inconstitucionalidade do entendimento normativo dado ao artigo 123.º número 3 do Código de Processo Civil, por violação do artigo 20.º números 1 e 4 da Constituição da República Portuguesa.» Cumpre apreciar e decidir. II – Fundamentação 4. O artigo 123.º, n.º 3, do Código de Processo Civil estabelece o seguinte, a propósito do julgamento do incidente de suspeição: «Concluídas as diligências que se mostrem necessárias, o presidente [da relação] decide sem recurso; quando julgar improcedente a suspeição, apreciará se o recusante procedeu de má fé.» No presente recurso está em causa saber se esta apreciação exige a audição prévia do recusante, sob pena de, no caso de a mesma culminar numa decisão de condenação deste último como litigante de má fé, ocorrer uma violação do princípio do contraditório. 5. Sobre o princípio em apreço, tem este Tribunal uma jurisprudência consolidada. Seguindo de perto a análise desenvolvida no Acórdão n.º 510/15 (vide, em particular, o seu n.º 4; este Acór- dão, assim como os demais adiante referidos, a partir da ligação http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/ ) , dir-se-á, conforme também já salientado no Acórdão n.º 86/88, que o referido princípio «se integra no âmbito da garantia de acesso ao direito, a qual abrange, “entre o mais, um direito a uma solução jurídica dos conflitos, a que se deve chegar em prazo razoável e com observância das garantias de imparcialidade e independência, possibilitando-se, designadamente, um correto funcionamento das regras do contraditório, em termos de cada uma das partes poder 'deduzir as suas razões (de facto e de direito), oferecer as suas provas, controlar as provas do adversário e discretear sobre o valor e resultado de umas e outras' (cfr. Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, I, Coimbra, 1956, p. 364)”». «No Acórdão n.º 243/13 disse Tribunal, quanto às exigências do processo equitativo que: “[O] procedimento de conformação normativa deve ser justo e a própria conformação deve resultar num “processo materialmente informado pelos princípios materiais da justiça nos vários momentos processuais” (cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, 4.ª edição, Coim- bra Editora, Coimbra, 2007, anot. XVI ao artigo 20.º, p. 415). Se tal exigência não afasta a liberdade de con- formação do legislador na concreta estruturação do processo, a mesma “impõe, antes de mais, que as normas processuais proporcionem aos interessados meios efetivos de defesa dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos e paridade entre as partes na dialética que elas protagonizam no processo (Ac. n.º 632/99). Um processo equitativo postula, por isso, a efetividade do direito de defesa no processo, bem como dos princípios do contraditório e da igualdade de armas” (cfr. Rui Medeiros in Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=