TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

455 acórdão n.º 218/20 SUMÁRIO: I - A sanção pecuniária compulsiva legal – o adicional devido pelo não cumprimento atempado da obri- gação pecuniária a que o devedor se encontra adstrito –, prevista no n.º 4 do artigo 829.º-A do Códi- go Civil, não tem qualquer afinidade com o conceito de tributo, logo no plano subjetivo, uma vez que o tributo consiste numa prestação exigida a favor de entidades que desempenham funções ou tarefas públicas – o que exclui qualquer possibilidade de alocação, ainda que parcial, à satisfação de interesses titulados por particulares – a detentores de capacidade contributiva (imposto) ou a beneficiários ou causadores de uma prestação administrativa específica (taxa e contribuição financeira) – o que supõe coisa diferente do estatuto de sujeito passivo de uma obrigação civil de natureza pecuniária reconhe- cida por sentença transitada em julgado; e também não tem no plano funcional, porque a finalidade dos tributos não reveste natureza coercitiva, repressiva ou sancionatória; a sanção pecuniária compul- sória não tem natureza tributária, não se incluindo no âmbito da reserva relativa da competência da Assembleia da República estabelecida na alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição. II - Na delimitação do âmbito e alcance da proteção constitucional do direito à propriedade, a jurispru- dência constitucional vem partindo da ideia segundo a qual o conceito constitucionalmente relevante de propriedade privada não tem um conteúdo idêntico ou sobreponível ao seu correspondente con- ceito jus-civilístico, tendendo para fazer convergir o conceito constitucional de propriedade com o de património, daí extraindo a garantia das posições jurídicas ativas de índole patrimonial, mormente do direito do credor à satisfação do seu crédito, nele incluindo a faculdade da sua realização coativa à custa do património do devedor; ao contrário do que sucede com os créditos, os débitos não cons- tituem utilidades ou situações que envolvam uma vantagem de natureza patrimonial; pelo contrário, resultam de um dever jurídico de prestar, que recai sobre o sujeito passivo da relação obrigacional em consequência de (e em correspondência com) um direito subjetivo à realização da prestação, que pertence ao credor, pelo que pode duvidar-se da possibilidade de estender o âmbito da garantia Não julga inconstitucional a norma constante do n.º 4 do artigo 829.º-A do Código Civil, aditado pelo Decreto-Lei n.º 262/83, de 16 de junho (sanção pecuniária compulsória). Processo: n.º 397/19. Recorrente: Particular. Relatora: Conselheira Joana Fernandes Costa. ACÓRDÃO N.º 218/20 De 17 de abril de 2020

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