TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
432 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 165.º, n.º 1, alínea i) , da Constituição], o mesmo não poderá dizer-se do princípio da igualdade horizontal na contribuição para os encargos públicos por via do pagamento de impostos, extraído dos artigos 2.º e 13.º da Constituição, cuja violação foi invocada nas alegações. Esta questão, já nada tendo que ver com os limites, diretos ou reflexos, da interpretação da lei fiscal pelos tribunais, é uma questão nova, de natureza substancialmente diversa daquela que foi enunciada no requeri- mento de interposição do recurso, e sobre a qual não recai, por isso, qualquer dever de pronúncia. É o que resulta da jurisprudência constante deste Tribunal, segundo a qual os parâmetros constitucionais invocados no requerimento de interposição do recurso delimitam o domínio da cognição devida pelo Tribunal Cons- titucional (vide, entre outros, os Acórdãos n. os 28/15, 28/16, 156/17, 33/18, 269/19 e 500/19). Assim, esta nova questão não será apreciada. B. Do Mérito do Recurso 11. De acordo com a delimitação constante do requerimento de interposição, com o ajustamento resul- tante do despacho que se lhe seguiu, o objeto do presente recurso é integrado pelo artigo 9.º, n. os 1 e 2, do Código Civil, na interpretação segundo a qual a norma que se contém no n.º 2 do artigo 90.º do Código do IRC, na versão da Lei n.º 3-B/2010, relativa a deduções à coleta do IRC, pode ser objeto de uma interpreta- ção corretiva para efeitos de apuramento do quantum do imposto devido em resultado da aplicação das taxas de tributação autónoma previstas no artigo 88.º do mesmo Código. O principal argumento invocado para sustentar a inconstitucionalidade desta norma é, como se referiu já, a violação do princípio da legalidade fiscal, consagrado no artigo 103.º, n.º 2, da Constituição, segundo o qual «[o]s impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes». Esta alegação tem implícitas duas premissas que se impõe, antes do mais, desvelar. A pri- meira é a de que a norma interpretanda – o n.º 2 do artigo 90.º do CIRC – se integra no âmbito de matérias abrangidas pelo princípio da legalidade fiscal. A segunda é a de que desse princípio defluem exigências que se impõem, não apenas ao legislador, no momento da elaboração da lei, como também ao juiz no momento da sua interpretação. Quanto à primeira, não se crê que possa ser afastada pela mera circunstância de o artigo 90.º do CIRC versar, segundo a sua própria epígrafe, sobre o procedimento e forma de liquidação do IRC. Com efeito, importa reconhecer que a jurisprudência – em especial, a jurisprudência arbitral (vide, a este respeito, os Acórdãos deste Tribunal n. os 267/17 e 49/20) – vem apelando à interpretação do artigo 89.º e dos n. os 1 e 2 do artigo 90.º do CIRC para aferir da possibilidade de efetuar as deduções previstas no n.º 2 do artigo 90.º à coleta resultante da aplicação das taxas de tributação autónoma (vide, v. g. , entre muitos outros, os Acórdãos proferidos pelo CAAD nos Processos n. os 385/2017-T, 7/2018-T e 591/2018-T), pelo que não se trata aqui de uma norma puramente procedimental. Importa ainda relembrar que a incidência a que se refere o n.º 2 do artigo 103.º da Constituição não pode deixar de ser entendida em sentido amplo, sendo certo que, tal como esclarece José Casalta Nabais, «a incidência entendida em sentido amplo abarca todos os pressupostos de cuja conjugação resulta o nas- cimento da obrigação de imposto e, bem assim, os elementos da mesma obrigação, o que a reconduz à definição normativa: 1) do facto ou situação que dá origem ao imposto (pressuposto de facto, facto gerador ou facto tributário); 2) dos sujeitos ativo e passivos (contribuinte, responsáveis, substitutos) da obrigação de imposto; 3) o montante do imposto, em regra (sempre que se não trate de impostos de quota fixa) definido através do valor ou da quantidade sobre que recai o imposto (definição ou determinação em abstrato da matéria coletável), da percentagem desse valor ou do montante pecuniário por unidade da matéria coletável a exigir do contribuinte (definição da taxa ou das taxas ad valorem ou específicas) e das deduções à coleta (caso as haja); 4) dos benefícios fiscais.» (in O Dever Fundamental de Pagar Impostos , 3.ª reimpressão, Almedina, Coimbra, 2012, p. 362 – vide também Ana Paula Dourado e Paulo Marques, in Miranda, J./Medeiros R., Constituição Portuguesa Anotada, Vol. II, 2.ª edição, Universidade Católica Editora, Lisboa, 2018, p. 205).
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