TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
41 acórdão n.º 29/20 E foi exatamente este o procedimento que a decisão recorrida seguiu, tendo sido facultado às partes a possibi- lidade de se pronunciarem sobre o relatório pericial, o que fizeram, e foi-lhes ainda notificado os “esclarecimentos adicionais” que os Srs. Peritos prestaram por solicitação do Sr. Juiz, nada tendo dito. Não se vê em que medida esta solução infrinja o princípio constitucional do direito a um processo equitativo: os direitos que o n.º 4 do art. 1068.º faculta às partes, de se pronunciarem sobre o relatório pericial, requererem a realização de uma segunda perícia ou outras diligências, permitem assegurar um processo equitativo, ainda que nele não esteja contemplada a fase de alegações prevista para o processo declarativo comum no art. 604.º, n.º 3, alínea e) do CP Civil.» Em suma, o acórdão recorrido decidiu a apelação, na parte que ora releva, considerando, que não só o artigo 1068.º, n.º 4, do Código de Processo Civil não foi violado pela decisão da 1.ª instância, como tal preceito, na interpretação que dele foi feita, também não é materialmente inconstitucional. 10. Esta segunda questão de inconstitucionalidade normativa centra-se na circunstância de a tramitação do processo de liquidação de participações sociais, em especial o referido artigo 1068.º, n.º 4, não facultar às partes o direito de alegarem antes da decisão. Entendem os recorrentes que o «direito de as Partes alegarem de facto e de direito antes da prolação da sentença final constitui um princípio estruturante do processo civil, corolário do princípio constitucional do processo equitativo» e que, «[a]o invés do sustentado pelo tribunal a quo, essa exigência jurídico-constitucional de efetivo contraditório impõe-se, igualmente, ao julgador nos processos de liquidação de participações sociais, e, em especial, ao meio impugnatório integrado no regime jurídico do instituto da aquisição potestativa de ações tendente ao domínio total» (cfr. as conclusões K. e L. das respetivas alegações). Justifica-se, por conseguinte, delimitar em função de tal dimensão normativa o objeto do presente recurso: o artigo 1068.º, n.º 4, do Código de Processo Civil, interpretado no sentido de, antes de o juiz fixar o valor da participação social, ser facultado às partes pronunciarem-se sobre o relatório pericial e, quando necessário, requererem a realização de uma segunda perícia ou outras diligências, não lhes sendo, todavia, facultada a apresentação de alegações. B) Do mérito do recurso 11. O artigo 20.º da Constituição garante a todos o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legítimos (n.º 1), impondo ainda que esse direito se efetive através de um processo equitativo (n.º 4). Como se sintetizou no Acórdão n.º 462/16 (n.º 2.2), «o direito de ação ou direito de agir em juízo, efe- tivado através de um processo equitativo, entendido num sentido amplo, significa não apenas que o processo deverá ser justo na sua conformação legislativa, mas também que deverá ser um processo informado pelos princípios materiais da justiça nos vários momentos processuais, de modo a que seja adequado a uma tutela judicial efetiva». Assim, «a doutrina e a jurisprudência têm procurado densificar o princípio do processo equitativo através de outros princípios: (1) direito à igualdade de armas ou direito à igualdade de posições no processo, com proibição de todas as discriminações ou diferenças de tratamento arbitrárias; (2) o direito de defesa e o direito ao contraditório traduzido fundamentalmente na possibilidade de cada uma das partes invocar as razões de facto e de direito, oferecer provas, controlar as provas da outra parte, pronunciar-se sobre o valor e resultado destas provas; (3) direito a prazos razoáveis de ação ou de recurso, proibindo-se prazos de caducidade exíguos do direito de ação ou de recurso; (4) direito à fundamentação das decisões; (5) direito à decisão em tempo razoável; (6) direito ao conhecimento dos dados processuais; (7) direito à prova, isto é, à apresentação de provas destinadas a demonstrar e provar os factos alegados em juízo; (8) direito a um processo orientado para a justiça material sem demasiadas peias formalísticas. (Cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, 4.ª edição revista, Coimbra Editora, 2007,
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