TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
408 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 39.º Ora, poder-se-á não acompanhar inteiramente a argumentação do arguido acabada de transcrever, mas as ques- tões de violação de muitos dos princípios constitucionais que suscita parecem, ao signatário, pertinentes, muito embora se tenha por certo que o envio de peças processuais através de correio eletrónico não cumpre, exatamente, a mesma função que a transmissão das referidas peças processuais através do sistema Citius , uma vez que, neste último caso, tais peças ficariam, desde logo, devidamente integradas e estruturadas no seio do mesmo sistema, com a facilidade daí decorrente para a prossecução dos restantes trâmites processuais (comunicação às partes, acesso por parte do tribunal, etc.). Mas a questão fundamental a ter em conta é, porém, o da gravosa consequência de tal violação procedimental de entrega das peças processuais, que, no caso do Acórdão recorrido, se traduz na impossibilidade de o recorrente levar o seu requerimento de recurso à apreciação da instância ad quem . 40.º Ora, neste âmbito, há que ter particularmente em conta que o regime de nulidades processuais, em sede de processo penal, é particularmente exigente e se encontra sujeito ao princípio da nulidade (cfr. art. 118.º do Código de Processo Penal), estabelecendo a lei, neste domínio, que “a violação ou a inobservância das disposições da lei de processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei» (cfr. n.º 1 desta disposição). Ora, sintomaticamente, o Acórdão recorrido não invoca, como fundamento da nulidade que diz existir na transmissão a juízo do requerimento de recurso do arguido através de correio eletrónico, nenhuma disposição do Código de Processo Penal, mas apenas disposições do Código Civil, designadamente os arts. 294.º e 295.º do mesmo diploma (cfr. supra n.º 5 e 15 das presentes contra-alegações). Não se vendo, por outro lado, mesmo que estivéssemos perante uma situação de nulidade à face da lei pro- cessual penal, que a mesma fosse insanável (cfr. art. 119.º do Código de Processo Penal) e não apenas que o acto pretensamente ilegal fosse irregular, o que determinaria que a respectiva nulidade estaria dependente de arguição (cfr. art. 120.º do Código de Processo Penal). 41.º Assim, por todas as razões invocadas ao longo das presentes contra-alegações, julga-se que este Tribunal Cons- titucional deverá: a) conceder provimento ao recurso de constitucionalidade interposto pelo arguido ora recorrente, A., nos presentes autos; b) revogar, nessa medida, o Acórdão recorrido, de 9 de novembro de 2016, do Tribunal da Relação de Coim- bra, que rejeitou o recurso interposto, pelo arguido e, nessa medida, confirmou o Acórdão proferida pelo Tribunal Coletivo do Tribunal Central de Leira, de 13 de julho de 2015, que condenou o mesmo arguido, pela prática de um crime de homicídio qualificado, na pena de 16 anos de prisão; c) com efeito, o Acórdão recorrido considerou não só extemporâneo, mas igualmente ferido de nulidade, o envio do requerimento de interposição de recurso do arguido para o Tribunal da Relação de Coimbra, por o mesmo ter sido formalizado através de transmissão por correio eletrónico, num primeiro momento e em suporte de papel, num segundo momento, e não através da respectiva transmissão através do sistema Citius .» 5. Por cessação de funções no Tribunal Constitucional do relator originário foram os autos redistribuí- dos à ora relatora. Cumpre apreciar e decidir
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