TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
407 acórdão n.º 174/20 51 – O n.º 5 do Art. 20 da CRP consagra o direito à tutela jurisdicional efetiva, considerando assim insuficiente o direito de acesso ao direito e aos tribunais. 52 – E impondo que o legislador tenha esse princípio da efetividade em consideração no momento de tratar da organização dos tribunais e na delimitação, e definição, dos instrumentos processuais. 53 – Ao não reconhecer o correio eletrónico como uma forma possível de apresentação de peças processuais em processo penal, os sujeitos processuais vêm os seus direitos restringidos sem qualquer justificação. 54 – Na medida em que a restrição dessa forma de apresentação de peças processuais – correio eletrónico – não tem qualquer fundamento, nem qualquer motivação que a desaconselhe. 55 – Uma legislação que não permite a apresentação de peças processuais em juízo através de correio eletrónico, em processo penal, sem qualquer justificação, contrariando a evolução da legislação no sentido do aproveitamento das novas tecnologias com objetivo de desmaterializar a justiça e diminuir a morosidade da mesma, viola o disposto no Art. 18 da CRP, na medida em que, violando os princípios do acesso ao direito e aos tribunais, nomeadamente no direito à tutela jurisdicional efetiva, reconhecidos direitos fundamentais tutelados no Art. 20 do mesmo diploma fundamental, as suas restrições só se justificarão para salvaguardar um outro direito ou interesse protegido constitu- cionalmente. 56 – É de ponderar a intensidade lesiva/ofensiva da decisão que, na interpretação sindicada, não admite recurso para o Tribunal da Relação em relação à matéria de facto e de direito, bem como posteriormente, se fosse caso disso, para o Supremo Tribunal de Justiça, em matéria de direito. 57 – O que não é seguramente o caso da restrição, sem qualquer fundamento ou justificação, dos meios para apresentação das peças processuais, considerando ilegal, ou mesmo nula tal forma de apresentação – correio eletrónico. 58 – Violado encontra-se também o princípio da proporcionalidade consagrado no Art. 18 da CRP, também cha- mado princípio da proibição do excesso, já que tal interpretação não tem em vista a prossecução dos fins visados pela lei (princípio da adequação), nem se mostra necessário a eliminação do correio eletrónico dos meios para a remessa das peças processuais (princípio da necessidade), e, por fim, as restrições devem ser consideradas justas medidas, ou seja, que não sejam desproporcionadas e excessivas (princípio da proporcionalidade em sentido estrito). 59 – Ao considerar nula e ilegal a remessa a juízo de peças processuais através de correio eletrónico, está a ser vio- lado direito ao Recurso, que se traduz na reapreciação da questão por um Tribunal superior, quer quanto à matéria de direito, quer quanto à matéria de facto, 60 – Já que em processo penal o direito de defesa pressupõe um duplo grau de jurisdição. 61 – Além da violação do direito de defesa e do direito ao recurso, consagrados no Art. 32 da CRP, também o princípio consagrado na mesma norma constitucional da presunção de inocência do arguido, numa das suas dimen- sões mais importantes, que chega a assumir um valor autónomo – a obrigatoriedade de julgamento no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa – também se encontra violado já que tal meio processual se integra numa das medidas implementadas para aumentar a celeridade processual. 62 – Seria aliás completamente desproporcional esta restrição nas possibilidades de envio das peças processuais para os tribunais, já que não se consegue apreender qualquer justificação para o fazer. 63 – Ora, ao facilitar a comunicação entre os cidadãos que buscam a justiça e os tribunais que a administram, a utilização do correio eletrónico para a remessa a juízo das peças processuais em processo penal, respeitará o direito constitucional consagrado no mesmo Art. 32.º da CRP ao processo célere. 64 – A contrario , poderemos afirmar que esse direito constitucionalmente consagrado será violado com a inter- pretação segundo a qual tal utilização não é admissível. 65 – A segurança e a autenticidade em momento algum seria colocada em causa já que estamos perante um meio de envio muito idêntico, mas mais prático e mais rápido, do que o envio por telecópia, 66 – Nomeadamente se se proceder à entrega do original e dos respectivos duplicados, ou do seu envio por correio registado, dentro dos cinco dias posteriores.”
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