TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
405 acórdão n.º 174/20 Já nos casos em que também as omissões, insuficiências ou deficiências em causa se verifiquem apenas nas con- clusões – e não na motivação –, o entendimento do Tribunal tem sido no sentido de se pronunciar pela inconstitu- cionalidade das interpretações normativas no sentido da rejeição imediata do recurso, sem possibilidade de convite ao aperfeiçoamento. Assim, entre outros, nos acórdãos n. os 192/02, 529/03, 322/04, 405/04, 357/06 e 485/08 o Tribunal concluiu pela inconstitucionalidade da referida norma do artigo 412.º, n. os 3 e 4, do CPP, interpretado no sentido de que a falta, apenas nas conclusões da motivação do recurso – e não na motivação – das menções aí contidas determina a imediata rejeição do recurso, sem possibilidade de convite ao aperfeiçoamento.” 36.º Ora, no caso dos presentes autos, o arguido, ora recorrente, apresentou tempestivamente as suas alegações de recurso, primeiro por correio eletrónico, depois em suporte de papel, sendo, por isso, tais alegações suscetíveis de ser conhecidas e apreciadas pelo Tribunal da Relação de Coimbra, ora recorrido. E a imediata rejeição do recurso, pelo simples motivo de não ter sido apresentado por transmissão eletrónica de dados (uma simples deficiência), sem se dar a possibilidade ao recorrente de suprir o seu lapso e de corrigir a forma de apresentação da sua peça processual, ainda mais quando se possa contestar estar-se perante um lapso e não perante uma possibilidade legalmente admissível de apresentação da mesma peça em juízo, traduz-se numa decisão que acaba por lhe não permitir o acesso a uma decisão adequada à sua pretensão, ou seja, que lhe nega o acesso ao tribunal e a uma tutela jurisdicional efetiva, restringindo o seu direito de defesa e o seu direito ao recurso e a um duplo grau de jurisdição, previstos no art. 32.º da Constituição. Com tal atuação, não se crê que a instância recorrida haja propugnado por «um processo informado pelos princípios materiais da justiça nos vários momentos processuais, de modo a que seja adequado a uma tutela judicial efetiva», ou haja concretizado um «direito a um processo orientado para a justiça material sem demasiadas peias formalísticas». Por outras palavras, «os ónus impostos não poderão, por força dos artigos 13.º e 18.º, n. os 2 e 3, da Constitui- ção, impossibilitar ou dificultar, de forma arbitrária ou excessiva, a atuação procedimental das partes, nem as comi- nações ou preclusões previstas, por irremediáveis ou insupríveis, poderão revelar-se totalmente desproporcionadas face à gravidade e relevância, para os fins do processo, da falta cometida, colocando assim em causa o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva». O que, pelo contrário, se esperaria, da instância recorrida, era a concretização da ideia de que «o direito ao processo, conjugado com o direito à tutela jurisdicional efetiva, impõe que se atribua prevalência à justiça material sobre a justiça formal, evitando-se soluções que, devido à exigência de cumprimento de «requisitos processuais», conduzam a uma decisão que, bem vistas as coisas, se poderá traduzir numa verdadeira denegação de justiça». 37.º Pelos mesmos motivos, se julga que assiste razão ao arguido, ora recorrente, quando considera, nas suas alega- ções de recurso para este Tribunal Constitucional (cfr. fls. 112-113 dos autos) (destaques do signatário): “25 – O Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra que rejeitou o recurso do Recorrente A. entendeu não ser admissível a utilização de correio eletrónico com meio legal de apresentação em juízo de actos processuais escritos, pelos sujeitos, no âmbito do processo penal, pelo que se pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a inconstitu- cionalidade da norma extraída interpretativamente dos Art. 150.º, n.º 1, alínea d) e n.º 2 do C. P. Civil de 1961, na redação do Decreto-Lei n.º 324/2003, 27/12, e a Portaria n.º 642/2004, de 16/06 e Portaria 114/2008, de 06/02, e ainda, o Art. 4.º da Lei n.º 41/2013, de 26/06, o Art. 144.º, n. os 1, 7 e 8 do novo C. P. Civil, e a Portaria n.º 280/2013, de 26/08, no sentido de não ser admissível a utilização de correio eletrónico como meio legal de apre- sentação em juízo de actos processuais escritos, pelos respectivos sujeitos, no âmbito do processo penal. 26 – E que a norma contida nos Art.s 286, 294 e 295 do Código Civil, Art 195 do novo Código de Processo Civil determinava que o recurso apresentado pelo arguido a juízo, por correio eletrónico, no âmbito do processo penal, é nulo.
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