TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

39 acórdão n.º 29/20 conhecimento (apenas) da questão relativa aos artigos 149.º e 199.º do Código de Processo Civil fundada na inutilidade do recurso. Na sua contra-alegação, a recorrida defende igualmente que, por a norma sindicada não ter constituído ratio decidendi , não se pode conhecer do objeto do recurso quanto à aludida questão relacionada com os citados preceitos do Código de Processo Civil (vide as respetivas conclusões 1.ª a 4.ª), e, adicionalmente e com base no mesmo tipo de fundamento, coloca em questão a possibilidade de se conhe- cer da inconstitucionalidade da norma extraída do artigo 1068.º, n.º 4, do mesmo Código (vide ibidem , as conclusões 5.ª a 13.ª). 7. O recurso de constitucionalidade tem um carácter instrumental em relação à decisão recorrida, pelo que a sua admissibilidade depende da existência do interesse processual em ver revogada a decisão proferida, ou seja, «é ainda indispensável que a eventual procedência do recurso seja útil» (cfr. Miguel Teixeira de Sousa, “Legitimidade e Interesse no Recurso de Fiscalização Concreta da Constitucionalidade” in Estudos em Home- nagem ao Prof. Doutor Armando M. Marques Guedes, Coimbra Editora, Coimbra, 2004, pp. 947 e seguintes, p. 958). Assim, prossegue o mesmo Autor (vide ibidem , pp. 958-959), «[O] recurso de constitucionalidade apresenta-se como um recurso instrumental em relação à decisão da causa, pelo que o seu conhecimento e apreciação só se reveste de interesse quando a respetiva apreciação se possa repercu- tir no julgamento daquela decisão (cfr. TC 768/93, TC 769/93, TC 162/98; TC 556/98; TC 692/99). Expressando a mesma orientação noutras formulações, o Tribunal Constitucional afirmou que o recurso de constitucionalidade desempenha uma função instrumental, pelo que só devem ser conhecidas questões de cons- titucionalidade suscitadas durante o processo quando a decisão a proferir possa influir utilmente na decisão da questão de mérito em termos de o tribunal recorrido poder ser confrontado com a obrigatoriedade de reformar o sentido do seu julgamento (TC 60/97), e concluiu que o recurso de constitucionalidade possui uma natureza instrumental, traduzida no facto de ele visar sempre a satisfação de um interesse concreto, pelo que ele não pode traduzir-se na resolução de simples questões académicas (TC 234/91, […]; TC 167/92).». Por isso, o objeto do recurso de constitucionalidade deve coincidir com a ratio decidendi da decisão recorrida. A utilidade do recurso de constitucionalidade encontra-se liminarmente afastada quando, desig- nadamente, o critério normativo sindicado não coincide com o que foi aplicado pelo tribunal a quo. Em consonância, o Tribunal Constitucional tem os seus poderes de cognição em fiscalização concreta da cons- titucionalidade limitados à norma que a decisão recorrida, conforme os casos, tenha aplicado ou a que haja recusado aplicação (cfr. o artigo 79.º-C da LTC). 8. A primeira questão de constitucionalidade suscitada pelos recorrentes respeita à interpretação norma- tiva extraída da conjugação dos artigos 149.º e 199.º do Código de Processo Civil segundo a qual deve ter-se por sanada uma nulidade processual, arguida dentro do prazo legal de interposição de recurso ordinário e juntamente com este, no caso de nulidade processual que se revele apenas na sentença recorrida. Contudo, a mera leitura do acórdão recorrido evidencia que não foi essa a sua ratio decidendi : «Defendem os Reclamantes que “estando a nulidade processual coberta pela própria sentença”, o meio próprio para reagir é não a reclamação mas o recurso, citando vários acórdãos em abono da sua posição. É certo que a doutrina e jurisprudência têm entendido que se “a nulidade está coberta por uma decisão judicial, que ordenou, autorizou ou sancionou o respetivo ato ou omissão, em tal caso o meio próprio para a arguir não é a simples reclamação, mas o recurso competente” […]. A nulidade está coberta por uma decisão judicial se a mesma pressupõe o ato viciado; neste caso, o meio pró- prio para reagir contra a ilegalidade cometida não é a arguição ou reclamação por nulidade, mas a impugnação da respetiva decisão pela interposição do competente recurso […].

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