TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

387 acórdão n.º 174/20 VII - O Tribunal Constitucional já sublinhou que, em situações em que o não cumprimento, ou o cum- primento defeituoso, de certos ónus processuais pelo arguido é suscetível de implicar a perda defini- tiva de direitos ou a preclusão irremediável de faculdades processuais, se deveria equacionar a prévia formulação de convite ao arguido para suprimento da deficiência; cominar, sem mais, com o vício de nulidade, o ato de apresentação, tempestivo, através de correio eletrónico, do recurso, em sede de processo penal, afigura-se desproporcionado; a desproporção não resulta propriamente da consequên- cia (rejeição do recurso), mas sim do seu caráter imediato, com efeitos definitivos, sem intermediação de uma oportunidade de suprimento; neste caso, o convite à apresentação do requerimento de recurso pela via considerada exigível configura uma medida de adequação do processado apta a suprir uma omissão estritamente formal, não comprometendo o equilíbrio de obrigações e direitos inerente a um processo justo e equitativo; diante da existência de alternativas válidas e adequadas, a imposição de uma consequência traduzida na desconsideração definitiva do requerimento de recurso, funda o juízo de desproporcionalidade da solução normativa que não admite aquele convite. VIII - Uma vez que a decisão de inconstitucionalidade a formular é limitada a essa dimensão normativa, emite-se um julgamento de inconstitucionalidade parcial, devendo a norma que, ao tempo dos autos, cominava com nulidade o recurso apresentado pelo arguido a juízo, por correio eletrónico, dentro do prazo, no âmbito do processo penal, sem prévio convite à apresentação daquela peça processual pela via considerada exigível – resultante da interpretação normativa sob apreciação –, ser julgada inconsti- tucional por ferir, de forma desproporcionada, o direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva, na modalidade de direito a um processo equitativo. Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. A., ora recorrente, foi condenado pelo Tribunal da Comarca de Leiria – Instância Central – Secção Criminal, por acórdão proferido em 13 de julho de 2015, por um crime de homicídio qualificado, na pena de 16 anos de prisão. Inconformado, o arguido recorreu desta decisão para o Tribunal da Relação de Coimbra, tendo apresen- tado o recurso, primeiro por correio eletrónico, em 1 de outubro de 2015, e depois em suporte de papel, em 6 de outubro do mesmo ano. Este recurso foi admitido por despacho de 20 de outubro de 2015 do Tribunal da Comarca de Leiria, onde se fixou a sua subida «de imediato, nos próprios autos e com efeito suspensivo». Subidos os autos ao Tribunal da Relação de Coimbra, este procedeu à notificação do arguido «da even- tualidade da ponderação/ajuizamento da invalidade/extemporaneidade dos respetivos recursos» (cfr. fls. 3 dos autos). O Tribunal da Relação de Coimbra proferiu, então, acórdão em 9 de novembro de 2016 (cfr. fls. 2-73 dos autos), onde concluiu pela rejeição do recurso do recorrente. Como fundamento do decidido quanto a este aspeto, refere-se (cfr. fls. 5-8 dos autos): «Por efeito da expressa revogação pelo art. 4.º/ a) da Lei n.º 41/2013 (de 26/06) do quadro legal em que se fundou o Acórdão de Uniformização de Jurisprudência (AUJ) n.º 3/2014 (de 06/03/2014) do Supremo Tribunal de Justiça, maxime do art. 150.º/1/d/2 do Código de Processo Civil de 1961 (aprovado pelo D.L. n.º 44129, de

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