TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

383 acórdão n.º 160/20 gender equality , European Parliament, 2014 – um estudo pedido ou encomendado pela Comissão do PE relativa aos Direitos das Mulheres e à Igualdade de Género). Segundo estatísticas dos Estados membros da EU, cerca de 60% a 90% das pessoas prostituídas são vítimas de crimes de tráfico ( Ibidem ). Desde 1979, que as Nações Unidas têm por objetivo combater todas as formas de tráfico das mulheres e de exploração da prostituição das mulheres, conforme consta do artigo 6.º da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW). A regulação jurídica e penal desta matéria encontra-se em evolução nos países da UE, visando a definição de políticas fortes de combate à exploração sexual e a elaboração de convenções e diretivas dirigidas ao alargamento da incriminação e ao aumento das penas quando a pessoa prostituída é menor de idade (Diretiva 2011/93/UE) ou vítima de tráfico (Con- venção do Conselho da Europa contra o tráfico de seres humanos, de 2005, e as Diretivas 2011/36/UE e 2012/29/UE). Os legisladores europeus aderiram a modelos diversos em matéria de prostituição: o modelo liberal da regula- ção da atividade como trabalho sexual (em vigor na Alemanha e na Holanda, mas ineficaz no combate ao tráfico, tendo provocado o aumento do mesmo, com indivíduos condenados por tráfico a pedirem licenciamento para o negócio da prostituição, sem qualquer melhoria das condições de trabalho das pessoas prostituídas e descida dos níveis de violência); o modelo abolicionista, em vigor na Suécia, na Noruega, na Islândia, na França e na Irlanda do Norte, que criminaliza todas as atividades relacionadas com a prostituição, inclusive o comprador de sexo, mas não as pessoas prostituídas (recomendado pelo Parlamento Europeu, na “Resolução de 26 de fevereiro de 2014, sobre a exploração sexual e a prostituição e o seu impacto na igualdade dos géneros”, por ter contribuído para a diminuição do tráfico de pessoas e da prostituição, bem como para uma alteração de mentalidades, normas e valo- res da população em relação à prostituição), e o modelo em vigor em Portugal, e noutros países europeus, que pune o lenocínio, de uma forma mais ou menos alargada, encontrando-se Portugal entre os países que prescindem, na definição do âmbito da incriminação, do requisito típico da exploração de um estado de necessidade e que pune, no artigo 160.º, n.º 6, do CP, quem, tendo conhecimento do crime de tráfico, utiliza, mediante pagamento ou outra contrapartida, os serviços da vítima. Existe consenso entre os Estados membros da UE de que o tráfico de pessoas e a exploração sexual devem ser erradicados, afirmando-se no estudo «Sexual exploitation and prostitution and its impact on gender equality», de 2014, atrás citado, p. 9, que «A prostituição e a exploração sexual são assuntos altamente genderizados, com mulheres e meninas, na maioria dos casos, a vender o seu corpo, por coação ou com consentimento, e homens e rapazes a pagar por este serviço» (sobre dados estatísticos, na Holanda, vide TAMPEP, 2009, Netherlands Country Report, citado no estudo do Parlamento Europeu, p. 37, segundo os quais, em 2008, 90% das pessoas prostituídas eram mulheres e a maioria das mulheres prostituídas eram migrantes, principalmente da Europa de Leste). Segundo o mesmo estudo do Parlamento Europeu, está a «ganhar apoio crescente a conceção que entende que o negócio da prostituição não pode ser legitimado, por violar os princípios ínsitos na Carta dos Direitos Fundamentais, entre os quais se encontra o princípio da igualdade» (Ibidem, p. 9). No quadro social e jurídico descrito, dada a complexidade da definição dos instrumentos legais adequados à proteção das pessoas prostituídas e ao combate ao tráfico, não pode deixar de se entender que está dentro da margem de liberdade do legislador democrático consagrar o modelo de criminalização do lenocínio, nos moldes em que o faz o artigo 169.º, n.º 1, do CP, que não padece assim de qualquer vício de inconstitucionalidade material, por violação do princípio da proporcionalidade ínsito no artigo 18.º, n.º 2, da CRP. […]” (itálicos acrescentados). Sendo certo que os fundamentos transcritos assentam em determinadas pressuposições, não é menos certo que, como se faz notar no Acórdão n.º 90/18: “[…] [N]ão se pressupõe que as situações de prostituição estejam necessariamente associadas a carências sociais elevadas e que qualquer comportamento de fomento, favorecimento ou facilitação da prostituição comporta uma exploração da necessidade económica ou social do agente que se prostitui, mas antes que tais situações comportam

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