TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

347 acórdão n.º 151/20 Daí que, mesmo no domínio processual penal e contraordenacional, o Tribunal Constitucional distinga dois tipos de situações. Nos casos em que as omissões, insuficiências ou deficiências em causa ocorrem não apenas nas conclusões do requerimento recurso, mas também na respetiva motivação, o Tribunal Constitucional tem formulado juízos nega- tivos de inconstitucionalidade em relação a interpretações normativas no sentido de que, em tais circunstâncias, não deverá ser conhecida a matéria em questão, improcedendo o recurso, sem que ao recorrente seja dada a opor- tunidade de suprir tais deficiências. É o caso, por exemplo, dos Acórdãos n. os 259/02, 140/04 e 660/14, em que o Tribunal não julgou inconstitucional a norma constante do artigo 412.º, n. os 3 e 4, do CPP, quando interpretada no sentido de que a falta de indicação, na motivação e nas conclusões de recurso em que se impugne matéria de facto, das menções aí exigidas, tem como efeito o não conhecimento dessa matéria e a improcedência do recurso nessa parte, sem que ao recorrente seja dada a oportunidade de suprir tais deficiências. Já nos casos em que também as omissões, insuficiências ou deficiências em causa se verifiquem apenas nas conclusões – e não na motivação –, o entendimento do Tribunal tem sido no sentido de se pronunciar pela inconstitucionalidade das interpretações normativas no sentido da rejeição imediata do recurso, sem possibilidade de convite ao aperfeiçoamento. Assim, entre outros, nos Acórdãos n. os 192/02, 529/03, 322/04, 405/04, 357/06 e 485/08 o Tribunal concluiu pela inconstitucionalidade da referida norma do artigo 412.º, n. os 3 e 4, do CPP, interpretado no sentido de que a falta, apenas nas conclusões da motivação do recurso – e não na motivação – das menções aí contidas determina a imediata rejeição do recurso, sem possibilidade de convite ao aperfeiçoamento. […]” (itálicos acrescentados). 2.6. Tendo presente a jurisprudência atrás referida, que corresponde a um entendimento consolidado do Tribunal Constitucional, importa então apreciar a norma sub judice perante as exigências de proporcio- nalidade da Lei Fundamental (seguindo o critério supra indicado – Acórdãos n. os 197/07, 277/07, 332/07, 96/16, 277/16, 486/16, 527/16, 270/18, 604/18 e 440/19, entre outros). Não carece de demorada explicação a conclusão de que a exigência da junção de cópia do acórdão- -fundamento é justificada. Se o recorrente pretende invocar perante o STJ uma contradição entre decisões, é razoável que se estabeleça como seu o dever de instruir as alegações com os elementos necessários à apreciação da pretensão recursória. Não se trata, por outro lado – é uma evidência –, de um ónus particularmente gravoso ou difícil de satisfazer por parte do recorrente. A consequência do incumprimento – imediata rejeição do recurso, sem prévio convite ao aperfeiçoa- mento –, porém, é claramente desproporcionada. Trata-se de assinalar àquela falta a consequência da perda definitiva do direito a recorrer, por razões que não têm que ver com as condições substanciais de recorribili- dade (essas não chegam a ser apreciadas), mas unicamente com base numa omissão formal. Tal omissão – só por si – tem um caráter marcadamente secundário, pois é compatível com casos (de que o recurso de revista interposto nestes autos é exemplo) em que o acórdão-fundamento está identificado com referências objetivas suficientes (tribunal, data e número de processo) nas alegações de recurso. Assim – só por si, insiste-se – a omissão revela uma negligência ligeira na instrução do recurso pelo recorrente. Não pode certamente afirmar-se que as exigências constitucionais de um processo equitativo podem apagar a autorresponsabilidade das partes ao ponto de transferir para o tribunal a obrigação de documentar o recurso com uma cópia do acórdão-fundamento, mas o convite ao aperfeiçoamento não tem esse signifi- cado nem essa consequência: trata-se de conceder uma oportunidade de suprir a falta, o que continua a ser um ónus da parte. Assim, a sensível desproporção não resulta propriamente da consequência (rejeição do recurso), mas sim do seu caráter imediato, sem intermediação de uma oportunidade de suprimento. O apelo a razões de celeridade não atenua significativamente o marcado excesso da consequência. Nem um convite no prazo geral para prática de atos processuais, que é de 10 dias (artigo 149.º, n.º 1, do CPC), é suscetível de causar um atraso significativo no processo, nem o recurso em causa – uma vez mais, só por

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