TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

303 acórdão n.º 136/20 63. Não restando, pois, dúvidas, de que o que deverá ser apreciado é a conformidade do art. 655.º do CPC com a Constituição, quando interpretado no sentido constante do acórdão recorrido e acima transcrito. 64. Como dúvidas não subsistem de que pode ser suscitada a questão da conformidade constitucional de uma determinada interpretação normativa constante da decisão recorrida e não apenas de uma determinada norma. 65. Note-se que o art. 80.º da LTC prescreve: “3 – No caso de o juízo de constitucionalidade ou de legalidade sobre a norma que a decisão recorrida tiver aplicado, ou a que tiver recusado aplicação, se fundar em determinada interpretação da mesma norma, esta deve ser aplicada com tal interpretação no processo em causa.” 66. A este propósito, leia-se Mafalda Serrasqueiro in “Legalidade e interpretação: a sindicabilidade pelo Tribu- nal Constitucional das normas enunciadas pelo juiz em matérias sujeitas aos princípios da legalidade e da tipici- dade, acessível por intermédio do lin k http://www.scielo.mec.pt/pdf/epub/v2n2/v2n2a17.pdf: “Por outro lado, a jurisprudência constitucional vem admitindo também, pacificamente, que o recurso de fiscalização possa incidir sobre determinadas interpretações normativas, na medida em que a norma é tomada não no seu sentido “objetivo” tal como plasmado no preceito ou fonte de onde emana, mas no modo específico como foi entendida e aplicada pelo juiz à resolução de um caso concreto. Assim, o que o recorrente levará à apreciação do Tribunal Constitucional será uma particular interpretação judicial da norma em apreço que, no seu entender, é violadora de um ou vários preceitos ou princípios constitucionais. Refira-se que o critério da necessária normatividade da questão sujeita a juízo terá inevitavelmente que se manter, pelo que é principal- mente neste campo que emergem as maiores dificuldades de delimitação entre uma questão normativa e uma mera sindicância da decisão tomada pelo tribunal a quo. De acordo com Lopes do Rego, o critério genérico ao qual se deverá recorrer para distinguir estas duas realidades deverá ancorar-se no facto de tal interpretação normativa ter sempre que incidir sobre um critério normativo da decisão, isto é, sobre uma regra abstratamente enunciada, com vocação para uma aplicação genérica, não podendo nunca pretender sindicar o puro ato de julgamento enquanto ponderação casuística da singularidade própria do caso concreto a que diz respeito.” 67. E, bem assim, Paula Margarida Tavares Falcão in “Sistema da Fiscalização Concreta da Constitucionalidade em Portugal”, acessível por intermédio do link https://repositorio.ucp.pt/ bitstream/10400.14/15245/1/Tese_indice_v03.pdf: “Complementarmente, o Tribunal Constitucional admite a fiscalização de interpretações normativas, tal como vem previsto pelo artigo 80.º n.º 3 da LOFTC.66 Incidindo a fiscalização, na interpretação judicial da norma, ou seja, no sentido em que a norma é tomada, relativamente, ao caso concreto, e não com o sentido genérico e abstrato que lhe é dado pelo preceito legal. O controlo da constitucionalidade realizado sobre uma dada interpretação judicial da norma, aplicada no caso concreto, que é tida por inconstitucional, na medida em que viola princípios ou preceitos constitucionais, é uma extensão clara do conceito de norma. Como refere, Carlos Lopes do Rego “Ao contrário do que ocorre com a delimitação do conceito “funcional e formal” de “norma”, em que, como se referiu, a jurisprudência constitucional “prescinde” das notas de generalidade e de abstração – a “interpretação normativa” sindicável pelo Tribunal Constitucional pressupõe uma vocação de generalidade e abstração na enunciação do “critério normativo” que lhe está subjacente – de modo a autono- mizá-lo claramente da pura atividade subsuntiva, ligada irremediavelmente a particularidades específicas do caso concreto. Neste sentido, veja-se ainda o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 391/15, publicado no DR n.º 224/2015, Série II de 2015-11-16: No sistema português de fiscalização de constitucionalidade, a competência atribuída ao Tribunal Cons- titucional cinge-se ao controlo da inconstitucionalidade normativa, ou seja, das questões de desconformi- dade constitucional imputada a normas jurídicas ou a interpretações normativas, e já não das questões de

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