TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
296 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL especifique que interpretação foi essa, ou quando interpretada de modo diverso daquele que o recorrente entende dever vingar no seu caso. É no entanto isso mesmo que se verifica nos presentes autos, uma vez que os recorrentes se limitaram a indicar que «qualquer outra interpretação deste artigo afigurar-se-á inconstitucional por violação dos princípios da proi- bição a indefesa e do contraditório, previstos no art. 20.º da Constituição e do princípio da igualdade, previsto no art. 13.º da Lei Fundamental» (sublinhado nosso), não surpreendendo, por isso, que, na sua decisão, aqui recorrida, o Supremo Tribunal de Justiça se tenha considerado eximido de se debruçar sobre qualquer questão de constitucionalidade. 11. Ao formular a pretensa questão de constitucionalidade naqueles termos, os recorrentes procuram condicio- nar a interpretação do direito infraconstitucional a adotar no caso concreto – sem que, todavia, isso corresponda ao enunciado de uma norma ou interpretação normativa, antes levando implícita uma crítica diretamente dirigida à decisão judicial adotada (e a adotar) pelo tribunal recorrido. De facto, a questão formulada pelos recorrentes também não apresenta o necessário caráter normativo. [N]ão se dirige realmente a uma avaliação da conformidade de qualquer norma com a Constituição, expressando antes uma discordância da sua parte quanto à forma como o tribunal recorrido aplicou certos preceitos de direito ordi- nário ao seu caso. É o que resulta com nitidez do seu requerimento de recurso, onde os recorrentes se limitam a transcrever o raciocínio desenvolvido no estrito plano infraconstitucional pelo tribunal recorrido. Os recorrentes não se insurgem verdadeiramente contra qualquer norma que lhes haja vedado o exercício do contraditório, mas contra a circunstância, em si mesma considerada, de o tribunal recorrido ter considerado que não havia, logo à partida, atentas as idiossincrasias do caso, lugar a esse exercício, visto que «a parte Recorrente foi notificada da referida peça e, tendo tido oportunidade de responder, nada disse.» Independentemente da razão que pudesse porventura assistir a um recorrente relativamente a determinada questão de direito ordinário, está simplesmente fora das competências do Tribunal Constitucional realizar esse tipo de sindicância, sob pena de ingerência em competências que no nosso sistema jurídico se encontram confiadas de modo exclusivo aos tribunais de outras ordens jurisdicionais.» 4. Inconformados, os recorrentes vêm reclamar desta Decisão Sumária, o que fazem nos seguintes termos: «Inconstitucionalidade da Norma prevista no n.º 2 do art. 186.º do CIRE 1. No referido acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 20 de setembro de 2018, o art. 186.º, n.º 2, do CIRE foi interpretado no sentido de que institui “(...) uma presunção iure et de iure , quer da existência de culpa grave, quer do nexo de causalidade (…) dos comportamentos aí descritos (...) para a criação ou agravamento da situação de insolvência, não admitindo prova em contrário”. 2. Na Decisão reclamada conclui-se pela não inconstitucionalidade dessa interpretação da referida norma mediante remissão para os argumentos constantes dos Acórdãos n. os 570/2008 e 70/2012. 3. Sendo certo que nenhum destes Acórdãos abordou a questão, colocada à apreciação deste Tribunal, da necessidade de prova do nexo de causalidade entre a atuação do administrador e a criação ou o agravamento da insolvência. 4. Consta do primeiro desses acórdãos (cujos argumentos são seguidos muito de perto por parte do segundo) que: “Ora, mais do que a determinação da natureza da norma (estabelecimento de uma presunção juris et de jure ou qualificação jurídica dos factos tipificados), o que é decisivo para a questão de constitucionalidade sus- citada é que, perante a prova de determinados comportamentos dos administradores da sociedade insolvente, se conclui pela verificação desse requisito, sem necessidade, nem sequer possibilidade, de um juízo casuístico efetuado pelo julgador perante todo o circunstancialismo do caso concreto.” 5. O que equivale a dizer aquilo que consta do acórdão do TRL aqui em apreço: que, provados os factos índice, não é possível aos administradores do insolvente provar que agiram sem culpa.
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=