TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
274 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL IV - Quanto ao teste do grau de onerosidade do cumprimento do prazo, não pode dar-se por demonstrado que a concessão da providência se encontre condicionada à verificação, no momento em que é decretada, do dano ou prejuízo que se visa evitar; não é em abstrato exigível, designadamente, que o trabalhador se encontre já privado da remuneração a que teria direito, se o ato impugnando não tivesse sido praticado – bastando o fundado receio de vir a ficar privado do correspondente rendimento; ainda que assim não se entendesse, sempre seria de reconhecer que, nessa hipótese, o verdadeiro obstáculo ao acesso à justiça cautelar não seria o prazo para requerer a providência, mas sim a interpretação normativa do artigo 120.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos que suportaria uma tal exigência. V - Não é possível dar por verificada a impossibilidade de demonstrar, no prazo de 30 dias, todos os pressu- postos de que depende a concessão da providência cautelar; tendo presente que a decisão administrativa cuja suspensão cautelar está em causa põe termo a um procedimento complexo, no âmbito do qual o tra- balhador deve ser informado, designadamente, das sanções disciplinares aplicáveis e chamado a apresentar defesa, nada indica que o cumprimento deste ónus processual se afigure especialmente difícil para os visa- dos pela decisão de demissão ou despedimento, nem que o seu incumprimento imponha consequências irreparáveis ou desproporcionadas face aos interesses públicos prosseguidos pela norma em questão. VI - Também não procede a alegação de que a imposição deste prazo diferencia arbitrariamente os trabalhado- res titulares de relações jurídicas de emprego público, que pretendam impugnar decisões que determinem a aplicação da sanção disciplinar de despedimento ou demissão; não pode no presente caso considerar- -se arbitrária a opção legislativa de submeter a composição de litígios emergentes de relações jurídicas de emprego reguladas pela Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP) a um regime processual distinto daquele que é aplicável ao contencioso laboral de relações abrangidas pelo Código do Trabalho; as diferenças entre aspetos isoladamente considerados desses regimes não indiciam, por si só, uma verda- deira diferença de tratamento entre litigantes; a mera invocação de que são aplicáveis regimes processuais distintos não basta, sequer, para dar por demonstrado que os trabalhadores que podem impugnar o des- pedimento nos termos previstos no Código de Processo doTrabalho e no Código doTrabalho, beneficiam de um regime privilegiado, face aos titulares de relações de emprego público abrangidas pela LTFP. VII - Já no plano de comparação entre os titulares de uma relação jurídica de emprego público, que pre- tendam ver suspensos os efeitos da decisão que determinou a cessação dessa relação, e a generalidade dos administrados que pretendam requerer a suspensão dos efeitos de qualquer ato administrativo, é de salientar que está aqui em causa a regulação provisória de uma relação jurídica especial, ou seja, de uma relação de emprego público; a especificidade desse vínculo, bem como a sensibilidade das con- sequências que advêm – seja para o trabalhador demitido ou despedido, seja para o serviço público em que este se encontrava integrado – de uma decisão de despedimento ou demissão disciplinar, cuja legalidade é contestada, é suficiente para infirmar a arbitrariedade imputada à diferenciação estabele- cida pelo legislador com a regra processual em crise. VIII - Além de ser objetivamente diferente a natureza da relação jurídica cuja composição provisória é reque- rida, as razões de interesse público – designadamente, a necessidade de preencher os postos de traba- lho deixados vagos em consequência da decisão de demissão ou despedimento de trabalhadores que deva produzir, prontamente, todos os seus efeitos e assim garantir o regular e contínuo funcionamento dos serviços – concorrem para oferecer fundamento material bastante à especial celeridade conferida ao processo cautelar em questão, não se vislumbrando que a dimensão normativa em apreço colida com qualquer outro parâmetro constitucional.
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