TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

237 acórdão n.º 130/20 Nesse exato sentido argumentou o Tribunal de Justiça da União Europeia, no seu acórdão de 2 de junho de 2016, C-418/14 ROZ- Ś WIT (disponível em eur-lex.europa.eu ) , que respeita a matéria com inegável parentesco com a do presente recurso, desde logo por se tratar da proporcionalidade de medidas de combate à fraude e evasão fiscal em domínio de impostos especiais de consumo harmonizado pelo direito da União Europeia. Nesse aresto, o Tribunal de Justiça foi confrontado com a questão de saber se contraria o princípio da proporcionalidade «uma regulamentação nacional nos termos da qual, por um lado, os vendedores de com- bustível são obrigados a submeter, no prazo estabelecido, um extrato mensal das declarações dos comprado- res, segundo as quais os produtos comprados se destinam a aquecimento, e, por outro, na falta de entrega de tal extrato no prazo fixado, é aplicável ao combustível vendido a taxa do imposto especial de consumo prevista para os carburantes, mesmo que se tenha constatado que não há dúvida de que esse produto se des- tinava a aquecimento.» O Tribunal começou por afirmar que, «constitui um instrumento de controlo que tem por objetivo a prevenção da evasão e da fraude fiscais a obrigação de entregar, junto das autoridades competentes, um extrato das declarações dos compradores», concluindo que a imposição de tal obrigação «não reveste um caráter manifestamente desproporcionado». Já no que diz respeito à consequência associada ao incumpri- mento da obrigação, entendeu que, «a aplicação automática da taxa de imposto especial de consumo pre- vista para os carburantes em caso de incumprimento da obrigação de entregar um extrato desse tipo viola o princípio da proporcionalidade.» Com efeito, «o facto de aplicar aos combustíveis de aquecimento em causa no processo principal a taxa de imposto especial de consumo prevista para os carburantes em razão da violação da obrigação, imposta pelo direito nacional, de apresentar um extrato das declarações dos compra- dores nos prazos fixados, quando se constatou que não havia dúvida de que esses produtos se destinavam a aquecimento, vai além do que é necessário para prevenir a evasão e a fraude fiscais.» O Tribunal de Justiça esclareceu ainda que, «nada impede um Estado-Membro de prever a aplicação de uma coima pela violação de uma obrigação como a que consiste na entrega às autoridades competentes de um extrato das declarações dos compradores do combustível de aquecimento vendido.» O que o princípio da proporcionalidade proscreve é que seja aplicada a taxa normal de imposto especial sobre o consumo a situações em que nada «indica que essas vendas foram realizadas com o objetivo de beneficiar de modo fraudulento da taxa de imposto especial de consumo preferencial atribuída aos combustíveis destinados a aquecimento». Estas considerações aderem perfeitamente ao problema de constitucionalidade que se coloca nos autos. A obrigação de o vendedor pagar a diferença entre a taxa de imposto normal e a aplicável ao gasóleo colorido e marcado, nos casos em que não é emitida fatura em nome do titular do cartão, «vai além do necessário para prevenir a fraude e evasão fiscal». A função sancionatória é plenamente assegurada no plano contraordena- cional, perfilando-se a sanção adicional imposta pela norma sindicada – com a estrutura de uma norma de incidência fiscal, ainda que servindo uma finalidade sancionatória − como um corpo estranho e funcional- mente redundante. A medida seria razoável – porventura até indispensável − caso se pudesse presumir a utilização abusiva do regime da venda do gasóleo colorido e marcado nos casos em que é registada a operação no sistema ele- trónico de controlo, não sendo emitida fatura em nome do titular do cartão. Porém, essa presunção – como vimos – não tem justificação alguma, razão pela qual a responsabilidade pelo pagamento da diferença entre o imposto devido com e sem benefício fiscal não tem natureza propriamente tributária. Nada no mero facto de não ter sido emitida a fatura em nome do titular do cartão, sendo apresentado o cartão e não sendo exigida demonstração de identidade, «indica que essas vendas foram realizadas com o objetivo de beneficiar de modo fraudulento da taxa de imposto» aplicável ao gasóleo colorido e marcado. Assim, é de concluir que a norma sindicada reprova no teste da necessidade, consubstanciando uma restrição excessiva (artigo 18.º, n.º 2) da liberdade de iniciativa económica, consagrada no artigo 61.º, n.º 1, da Constituição.

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